quinta-feira, 27 de agosto de 2015

E O Cordão...

Quando estava no quarto ano da faculdade de Direito, fui falar com um professor sobre uma nota.
Questionei-o sobre a pontuação obtida na prova e ele, com um sorriso de orelha a orelha, tascou: com esse sorriso e essas tuas covinhas, não precisas te preocupar com nota!
Nos tempos atuais, uma atitude assim, tão descarada, seria impensável.
Certamente a história iria parar nas redes sociais e aí, seria um salve-se quem puder,  ou melhor, o professor estaria sumariamente reduzido a pó de traque.
E minha resposta, qual foi?
Do alto de meus vinte aninhos, encarei o professor figurão, quarentão, bonitão, e falei: sim, mas minhas covinhas, e todo o resto, não são para o teu bico! Quero saber a razão de ter tido minha nota alterada.
Bueno.
Com isso quero dizer que, desde sempre, nunca fui puxa saco.
E, quando vejo alguém que tem esse hábito, primeiro sinto nojo.
Depois, raiva.
Por último, pena.
Não há necessidade alguma de puxar o saco do chefe para manter o cargo.
Pois o que, de fato, faz diferença, é o potencial de cada um.
Ainda hoje observo, abismada, como tem gente que se presta para fazer qualquer coisa, a fim de manter o status quo.
Como é possível?
Pior é que o puxa saquismo é tão evidente que todos, absolutamente todos, se dão conta da situação.
Mas, enfim, caráter não se aprende na Faculdade.
Entretanto, embora em um primeiro momento o puxa saco pareça estar por cima da carne seca, olhando para os demais como se fossem uma bolachinha quebrada, outros olhos o observam, e veem suas deploráveis atitudes.
Melhor dizendo, a falta de.
Portanto, quando me deparo com um puxa saco, sinto pena: de tão incompetente,  precisa estar sempre bajulando o superior, senão, balança e cai.
Ainda não me convenceram de que o estudo, a dedicação e o trabalho técnico valem menos que uma boa puxada de saco.
Não me convenceram!
Lamentavelmente, o que se vê é que o cordão dos puxa saco cada vez aumenta mais.
Sorte que - podem me taxar do que quiserem, dele nunca fiz, não faço e, se Deus quiser, não farei parte.





terça-feira, 18 de agosto de 2015

Réquiem Para os Livros

Como disse Santa Teresa, tudo passa.Só Deus não muda.
Quero crer que sim, adorável Santinha.
Tocou-me a triste tarefa de separar os livros que eram de meu Pai, documentos de antanho, pastas, fotografias, notas, bilhetes, recibos.
Foram dias separando tudo e, se não fosse pela ajuda que recebi do marido e de três fiéis funcionários, não teria conseguido, devido à extraordinária carga emocional que aquilo me trouxe.
Passei mais de semana chorando e pensava, queria escrever sobre tudo aquilo mas não tinha coragem, pois seria pesado demais.
Doloroso é ter que dar um fim a objetos que simbolizaram parte da história de nossas vidas mas que, por força das circunstâncias e do decurso do tempo, tornaram-se obsoletos e sem serventia.
Acumulavam pó, nada mais.
Simples assim, e extremamente triste, pois todos aqueles livros, coleções inteiras cuidadosamente enfileiradas nas estantes,  um dia foram úteis e tiveram seu passado de glória, lidos à exaustão, horas e horas de pesquisa, para que pudéssemos apresentar um trabalho digno e limpo.
Um trabalho bom.
Meu Pai, a toda certeza, logrou êxito em sua missão de operador do Direito.
Sobre a minha pessoa, o tempo dirá.
Mas o fato é que havia a necessidade de tirar todos os livros daquele local onde um dia foi o escritório de advocacia do Dr. Edgard.
Não foi possível fazê-lo de maneira rápida, o que talvez deixasse o processo menos dolorido.
Foram necessários vários dias e muitos ajustes, até que a última caixa saiu, e fechei a porta.
E como doeu!
Foi muito, muito difícil ver todos aqueles livros sendo tocados por mãos que não as do meu Pai, pois ele foi quem os adquiriu, cuidou, colecionou, limpou.
Livros de toda a vida!
Religiosamente, uma vez por semestre, ele contratava uma pessoa que ia lá para o escritório limpar os livros, um a um.
Que tarefa!
Ele tinha adoração por aqueles livros e eis que a mim, justo a mim, que amava e amo e sempre amarei meu Pai, e adoro livros, a mim coube tirá-los de circulação.
E, ao passo que via como iam sendo levados, vinha a minha cabeça, de maneira recorrente,  uma cena triste daquelas carruagens de antigamente, carregando pessoas.
Um réquiem para os livros.
Chorei uma semana, chorei no cantinho, na sala, da rua, na chuva e na fazenda, antes de dormir, e até dormir de tanto chorar, chorei no café da manhã, chorei tudo o que tinha para chorar.
Mas aí, como é de minha natureza, um belo dia eu acordei muito bem, e com uma energia nova.
Havia passado por mais uma prova, dessas que Ele me manda, e eu passo, pois não sou de fugir.
Fiz novos arranjos, perfumei a casa.
Levantei a cabeça e saí, para seguir em frente.
Sim, adorável Santinha, tens razão: tudo passa. Só Deus não muda.