sábado, 24 de agosto de 2019

Cabelos

Confesso que não queria mais escrever sobre o tema, mas ele retorna e sei que, de alguma forma, compartilhando minhas vivências, talvez eu possa ajudar alguém que esteja passando pelo problema que tive há um ano e do qual, com a graças de Deus, resultei curada.
Que palavra mágica, esta: cura.
Assim como alta.
E, igualmente, fim do tratamento.
Somente quem atravessa um árido deserto e, depois de meses de caminhada enxerga um oásis, sabe dimensionar o valor da Vida.
Vida, com V maiúscula!
Hoje, tentando pentear meus cabelos que, como eu, renasceram distintos, eles não iam nem para um lado e nem para o outro.
Rebelaram-se.
Puxa pra cá, escova pra lá, larguei de mão, não sem antes ter parado para olhar, encantada, o tamanho deles.
Para quem estava, há um ano, completamente careca, sem cílios de sem sobrancelhas, é uma dádiva ter, outra vez, cabelos.
Tê-los, inclusive, para tapar mis grandes orejas, que ficavam à mostra e davam a impressão de querer alçar voo.
Sempre tive cabelos lisos e fortes, e fiz tudo o que quis com eles, pintei, fiz mechas, já fui morena, loira, usei cabelos curtos, médios e longos, crespos, repicados...cabelos de geminiana.
Quando ouvi a médica me dizer que iria perdê-los e que seria interessante providenciar uma peruca, ou lenços, aquela fala não me causou nenhum efeito.
Apenas queria saber de cumprir o tratamento, de ultrapassar a tormenta, de nadar e de conseguir chegar à praia, os cabelos eram o de menos!
Pois assim encarei, estimados amigos, a perda gradual de minhas madeixas e, naquele mesmo dia, iniciei o processo de despedida.
Não foi uma separação triste.
No começo, não.
Apenas, uma nova fase que precisava ser encarada de frente e com um pouco de bom humor.
Fui a um salão de beleza, quinze dias antes de começar a quimioterapia, e cortei-os na altura da nuca.
Confesso que gostei, eles combinavam com meu rosto mais magro.
Após um mês, passei a máquina número 2.
Tampouco me importei, achei até bonitinho, um cabelinho batido, rente, e muito escuro, pois a pintura saíra toda.
No segundo mês do tratamento, estando no banho, sem aviso prévio, eles caíram.
Caíram todinhos, todos eles.
Aí, chorei.
E chorei muito.
Afinal, ficar sem um fio de cabelo era uma coisa, para mim, no mínimo estranha.
Eu me olhei no espelho e estava feia.
Feia!
Sem cabelos, sem cílios, sem sobrancelhas, branca como um papel, dez kg mais magra, e com uma saudade avassaladora de mim.
Naquele dia, eu me permiti chorar.
Em tantos outros também, mas ter tido que juntar do piso do box meus próprios cabelos foi doloroso.
Entretanto, como sempre tive fé, e aquele velho ditado do meu Pai que me acompanhava - fé em Deus e pé na tábua, lá fui eu de novo.
Caí, mas levantei.
Pedi forças, e Deus me deu!
O espelho e eu tivemos um tete a tete, e ele concordou em ser bom para mim, desde que eu mantivesse prudente distância.
Já que estava com a orelhas à mostra, que tal usar brincos grandes?
Maquiagem, perfume, batom e salto alto.
A careca reluzia, e eu estava me achando estilosa, sim senhor!
De todas as circunstâncias, sempre aprendemos grandes lições.
Hoje olhei para meus cabelos - outra vez fortes, fartos e encaracolados, e chorei.
Chorei muito.
De alegria, e de gratidão a Deus.
Viver é, sem dúvida, uma esplêndida aventura!


 








quarta-feira, 14 de agosto de 2019

Tempo, Tempo!

Costumo abrir a Bíblia ao acaso, não sem antes agradecer a Deus por estar aqui e desfrutar da ventura do dia que se descortina, novinho em folha e, igualmente, pedir respostas.
É notável como elas sempre vêm, e não que eu precise de provas do Senhor, de forma alguma!
Apenas, minhas indagações são plenamente satisfeitas e, por essa razão, divido com vocês o que está escrito em Eclesiastes 2-3:
Tudo tem seu tempo.  - Todas as coisas têm seu tempo e todas elas passam debaixo do céu segundo o termo que a cada uma foi prescrito. Há tempo de nascer e tempo de morrer. Há tempo de plantar. Há tempo de arrancar o que se plantou. Há tempo de matar e tempo de sarar. Há tempo de destruir e tempo de edificar. Há tempo de chorar e tempo de rir. Há tempo de se afligir e tempo de dançar. Há tempo de se espalhar pedras e tempo de as ajuntar. Há tempo de dar abraços e tempo de se afastar deles. Há tempo de adquirir e tempo de perder. Há tempo de guardar e tempo de lançar fora. Há tempo de rasgar e tempo de coser.Há tempo de calar e tempo de falar. Há tempo de amor e tempo de ódio. Há tempo de guerra e tempo de paz.
Divino!
Desculpem a redundância.
É que, para mim, o ato de rezar é magnífico, na medida em que me enche de paz, e as inquietações da alma tornam-se insignificantes.
Estava eu bastante aborrecida, pois ninguém gosta de sentir-se uma tola, ou usada.
 Talvez não sejam bem estas as palavras corretas para definir o que senti quando um amigo de longa data, há mais de ano, decidiu afastar-se de mim por divergentes opiniões políticas.
Devo acrescentar que o fez num momento crítico da minha vida: estava eu na metade das sessões de quimioterapia, portanto frágil, física e emocionalmente.
Fato é que, ante semelhante ato tão cruel quanto covarde, nada me restou a não ser guardá-lo no baú das ilusões perdidas.
Mas, notem bem, não lancei a sujeira do camarada no baú do esquecimento pois, entre meus incontáveis defeitos, eis um deles: perdoo, pero no me olvido.
O tempo passou.
Para ser mais exata, um ano.
E, certo dia, retorna o meu amigo, para contar-me os infortúnios pelos quais acabava de passar.
Respondi educadamente, inclusive, com afeto...(outro grave defeito).
Entrementes, o baú das ilusões perdidas se abriu, e dele, como um grande leque, por vezes colorido, outras tantas preto e branco e, em sua maioria, repleto de imagens cinzentas, o tempo partilhado com tão solerte pessoa veio à luz, a fim de não permitir que, uma vez mais, eu passasse recibo de idiota.
Na dúvida entre perdoar e seguir em frente e retomar a amizade, ou simplesmente sugerir ao mesmo que fosse lamber sabão, recorri ao Livro dos Livros, o qual, de forma sublime, aquietou meu coração.
Há tempo de dar abraços e tempo de se afastar deles.
Obtive minha resposta!






 

segunda-feira, 15 de julho de 2019

Pactos

Fiz alguns pactos comigo mesma.
Durante o tempo que julguei necessário, permaneci silente.
Um rico diálogo interior foi meu companheiro durante alguns meses, e meus queridos leitores reclamaram da minha ausência, fato que agradeço, pois demonstra o afeto que nutrem por mim.
Entretanto, não havia como escrever, pois eu estava imbuída em meu próprio resgate e, também, em observar o novo ser humano que emergia.
Para tal, foi necessário o silêncio.
 Este era de tal modo eloquente que, todos os dias, presenteava-me com coisas novas.
Uma delas era, (e é), sentar em algum lugar e escutar o som do vento.
Como diria Fernando Pessoa, " Às vezes ouço passar o vento; e só de ouvir o vento passar, vale a pena ter nascido."
Sim, sem dúvida, poder escutar o vento é uma grande dádiva.
E a paz que ele traz consigo, inigualável.
Decorrência direta dos traumas vividos durante todo o ano passado e o impacto por eles causado, fato é que chega um dia de sua vida no qual você decide: quer estar em paz, ter sossego e não mais se incomodar e muito menos ser incomodado com questões de grande ou de pequena monta, ou de seja lá o quê for.
Você incorporou ao seu modus vivendi a prática do silêncio curativo, da meditação, a escutar sua própria voz, antes abafada por tantos ruídos e exigências da sociedade, sem falar daquelas autoimpostas.
Aprendeu que é libertador dizer não, e que de nada adianta tentar tapar o sol com a peneira, pois as verdades são como o sol.
A vida me obrigou a parar da pior foma possível - através de uma doença grave, e a rever todos os meus valores, sentimentos e atitudes para com os demais e para comigo mesma.
Necessária depuração, daquelas faxinas internas que fazemos em circunstâncias difíceis.
Limpeza e purificação da alma, um solitário e extremamente proveitoso exercício de autoconhecimento e de renovação.
Estabeleci novos conceitos.
E fiz alguns pactos:
Reverencio, diariamente, a paz.
Saúdo a alegria.
Celebro a vida.
E procuro honrar, muito, a nova oportunidade que Deus me deu!





domingo, 10 de fevereiro de 2019

O Pequeno Ventilador


O calorão de hoje, típico do nosso Itaqui, onde só se ouvem as cigarras cantando, loucas de faceiras, me fez lembrar da casa paterna que era enorme, fresca, agradável.
Meus pais acordavam cedo e abriam toda a casa, para que a brisa da manhã ventilasse todos os cômodos.
Em torno de 10 horas, minha mãe fechava as persianas, sombreando tudo, e o sol inclemente não entrava.
No final a tarde, repetiam o ritual matutino e abriam as persianas, as portas, só que não havia brisa alguma.
Havia, isso sim, uma mosquitama infernal.
E um único ventilador, pequeno, com quatro pás de metal e o botão de ligar/desligar tão rente às pás que era preciso prestar muita atenção, sob pena de cortar os dedos.
Esse ventilador que, ao fim e ao cabo já parecia ter vida própria, era carregado para lá e para cá: ora estava na sala, depois ia parar no balcão da copa, ia parar no escritório do pai; em suma, estava sempre à mão.
A tardinha, meu pai pegava uma mangueira e molhava a calçada da frente da casa numa tentativa de amenizar o calor para, logo após, colocar cadeiras, onde toda a família sentava para tomar um mate.
E o pequeno ventilador, posto no corredor de entrada e virado para a calçada girava, fazendo um ventinho pífio...
Faltando algum de nós, meu pai gritava, com seu vozeirão...
Aparte:
A voz do meu pai é algo que jamais irei esquecer, bem como sua risada escandalosa, é, ele ria para que o mundo inteiro ouvisse e soubesse o quão feliz estava.
Outro dia postarei sobre a voz paterna.
Volta.
...ele gritava, com seu vozeirão: Kilaaaa(minha mãe), vem tomar o mateeee!!!
Assim passávamos até a janta, sempre tarde, 22 horas.
O ventilador era levado para a copa, para fazer de conta que refrescava alguma coisa.
E outra rodada de calçada.
Hora de dormir, aí sim, o calor era brabo.
Nós, os filhos, dormíamos sentindo as costas coladas ao lençol, pois o ventilador era um luxo destinado aos pais, e era isso.
Como é que conseguíamos, me pergunto, se hoje, sem um split, a gente não consegue respirar?
Dormíamos, sonhávamos e acordávamos no dia seguinte lépidos e faceiros, e nenhum pedaço de nós tinha caído.
De manhã, íamos tomar banho no Rio Uruguai, um hábito que minha mãe tinha e dele não abria mão.
O almoço, sempre às 13h, 13h30min., era lento, barulhento, afinal, éramos seis, e meu pai fazia questão de trazer a sobremesa: fatias de melancia, que ele mesmo cortava.
Fartos com aquela comilança, chegava a hora da sesta, que era sagrada.
Por volta de 16 horas, comíamos, pasmem, um prato fundo de trigo, regado a leite gelado, com pedaços de rapadura.
Que coisa boa!!!
São tantas as lembranças dos verões familiares, são muitas!
Onde terá ido parar o pequeno ventilador, de saudosa memória?









sábado, 9 de fevereiro de 2019

Não Me Entrego

O título reflete bem o meu sentimento de hoje.
Notem bem, falei de hoje.
É, porque ultimamente andei dando uma ré, entrando outra vez naquele túnel escuro do qual me vangloriei de ter saído, mas os dias me mostraram que as coisas não seriam assim, tão fáceis.
Aliás, eu já constatei que pra mim, nada vem de mão beijada, nada corre sobre rieles, isto é, sobre trilhos, deslizando.
Nada disso.
Tudo é muito suado e às vezes sinto-me um estivador, carregando sacas que são pesadas demais, e por isso me insurjo.
Fico com raiva.
A grama do vizinho sempre é mais verde.
Será?
Claro que não.
A vida não transcorre sem percalços.
Entretanto, é bom que se diga que esta força que detenho foi, única e exclusivamente, forjada por mim mesma.
De que me quejo, entonces?
Pois eu mesma lapidei esta rocha, legado que recebi de meus antepassados Fernández e Mondadori, sangue argentino e italiano misturados, com suas histórias de muitas lutas, mas também de inúmeras vitórias.
Assim sendo, fui buscar, saí atrás da força outra vez e, como diz a música de Mercedes Sosa, hice un nudo en el pañuelo, pero me acordé despues, que no fue la única vez, y segui cantando.
Sim, queridos amigos, basta já de recordar datas e fatos tristes.
Hoje faz um ano que recebi o diagnóstico que mudou minha vida.
Mas passou.
Terminou.
Deus me deu uma nova chance de fazer valer o que há de mais sagrado em mim, que é honrar tudo o que herdei, o muito que aprendi, e  agradecer a todos os que me deram suas mãos, e aqui, repriso, não nomeio ninguém para não incorrer no pecado da ingratidão, pois foram muitos.
Um novo tempo, de recomeços e de descobertas.
E para a alegria de muitos e, talvez, para a decepção de poucos, que já me viam estirada no campo de batalha, informo: não, não me entrego!
Mas não me entrego mesmo!!!