domingo, 29 de junho de 2014

Holandeses e Alemães

Terminou, há pouco, o jogo entre México e Holanda.
 Para felicidade geral da nação o México meteu 1x0 na Holanda, tudo parecia estar indo muito bem, mas eu comentei com o Alberto, daqui a pouco a Holanda faz 1 gol, e aí, adeus, México.
Eles são aquele tipo de povo que não desiste nunca, e não tem absolutamente nada a ver conosco, brasileiros e latinos.
Não se entregam fácil, não.
Basta rever um pouco da história da Holanda e da Alemanha para ver.
Por isso, embora infeliz, porque não esqueço que, graças a Holanda ficamos de fora da Copa de 2010, com o mesmíssimo Sneijder que fez o gol no México hoje, temos que reconhecer a técnica mas, acima de tudo, a garra.
Eles tem garra de sobra, não brincam em serviço.
Da mesma forma, os alemães.
Lutam até o último pingo de suor, estão morrendo mas continuam correndo e driblando.
Esse é o diferencial.
Nós, latino americanos, somos emoção e, depois, técnica.
Eles são exatamente o oposto: primeiro, ganham o jogo, e o jogo só acaba quando o árbitro apita, antes não. Enquanto isso, eles vão correndo e usando todas as armas e táticas para liquidar com o adversário, mesmo que, aparentemente, estejam sob condições desfavoráveis, como agora, com um calorão de 35 graus, torcida contra e o sol escaldante sobre suas cabeças.
Nada disso é capaz de abalar o ânimo selvagem dessa gente, ao contrário.
Quem assistiu ao jogo viu que, após o gol do México, eles partiram pra cima com uma gana tremenda, e conseguiram.
Eles são bons, é verdade, assim como os alemães.
Mas, acima de tudo, têm de sobra o que falta aos latino americanos: o desejo de vencer.A gente quer ganhar, sim, mas eles lutam mais.
Muito mais!
Eles querem vencer, eles vão lá e fazem o que tem que ser feito, são frios, são calculistas, pensam na festa depois.
Nós, ao contrário, ao primeiro sinal de vitória,  relaxamos.
Muito antes de a partida terminar, já estamos soltando foguetes.
Na verdade, nossos fogos de artifício servem apenas para sinalizar onde nossa defesa é mais fraca, e eles vem e atacam, sem dó nem piedade.
Enchem a cara depois, quando voltam para  o Primeiro Mundo.
Quando será que iremos aprender?

sexta-feira, 27 de junho de 2014

Meu Pequeno Milagre - II

Foi no mês de outubro de 1985 que, por um erro médico, quase fui parar no andar de cima com apenas 24 aninhos, deram-me uma medicação errada e, em razão disso, passei mal.
Muito mal.
Fazia uma meia hora que tinha tomado o tal remédio e senti que meus músculos ficaram retesados e sem movimento; estava em pé, queria sentar; sentava, queria levantar. Não conseguia quase falar, minha boca enrijeceu e assim fiquei por um bom par de horas até que fui a outro médico e este deu-me o remédio que seria o antídoto.
Seria.
Ao invés de tirar o efeito do medicamento anterior, potencializou-o.
Passei uma noite dos infernos, queria falar e minha voz não saía, tentava caminhar e não sentia as pernas, até que, lá pelas tantas, consegui me arrastar até a sala onde estavam meus pais e não falava, apenas pedia socorro com o olhar.
Lembro tão bem do desespero de meu Pai que, de imediato, ligou para Porto Alegre, para meu irmão mais velho, que morava lá, e este lembrou de um terceiro médico, enfim,  meu Pai falava e gritava e gesticulava, freneticamente, e eu ali, prostrada.
Meu irmão Edgard ligou para o médico e, de lá do Portinho, veio a receita que me salvou, meu Pai saiu em desabalada carreira rumo à farmácia e voltou e tomei o remédio que, quase de imediato, começou a fazer efeito, tirando-me daquele mundo nebuloso onde eu estava.
Entretanto, a coisa não seria tão fácil assim.
Levaria 25 dias até que o efeito do medicamento anterior saísse do meu organismo.
Emagreci 9 quilos em 28 dias.
Uma enfermeira me dava banho e levava a comida a minha boca, somente líquidos, pois eu não conseguia mastigar e nem engolir.
Caminhava arrastando os pés e apoiada em alguém, não tinha equilíbrio.
Certo tempo depois, minha tia Maria Luisa, minha adorada tia Mary, veio do Alvear e me trouxe uma estampinha com a novena de Nossa Senhora de Itati.
Conversamos muito, minha tia e eu, e ela me contou toda a história da Virgem, e do quanto era devota e dos tantos milagres alcançados.
Comecei a novena.
No nono dia, acordei bem.
Muito mais disposta, consegui caminhar sem o apoio da enfermeira.
Pedi para tomar um banho sozinha, ela foi comigo, preocupada, mas tomei meu banho tranquilamente, devagar, é verdade, mas consegui fazer todos os movimentos.
Consegui comer um purê de batatas com caldo de feijão, comi avidamente, pois fazia 25 dias que só tomava líquidos.
Era um dia lindo de sol, e eu quis sair para o pátio da nossa casa, depois para a rua.
Caminhei, depois de 25 dias acamada, sentindo o sol que banhava meu rosto, olhando o céu azulzinho do Itaqui, a grama verde sob os pés, as flores nos canteiros de minha Mãe...
Observava tudo que me cercava com um encantamento que não conseguiria explicar.
Tua recuperação foi um milagre, foi o que me disse o médico de Porto Alegre, 30 dias após o fato.
Outro milagre em minha vida!
Virgen de Itati, Madre de Diós, ruega por nosotros.
Muchas gracias, Madrecita!



Aquilo que Queremos

Muitas vezes fico me questionando se, com 53 anos, não deveria ser mais calma e tranquila.
Talvez ficar um pouco mais séria, rir menos, falar sobre assuntos de alta indagação, filosofar, usar óculos de armação preta e franzir o cenho.
Serena.
Ponderada.
Bem que tento.
Será?
Não!
Só de pensar em serenidade, sinto uma irritação profunda.
Quando dou por mim, já estou com alguma novidade em vista ou um outro projeto em andamento, isso é o que dá sentido a minha vida, o impulso de seguir, de caminhar, se desbravar novos caminhos e conhecer lugares e suas gentes, quem sabe voltar ao lugar que visitei diversas vezes, mas com um olhar diferente.
Essa inquietação geminiana é altamente complicada, inclusive para mim, queridos amigos, não pensem vocês que é fácil conviver com um caldeirão interior, quase sempre em ponto de ebulição.
Por isso digo, quem sabe eu tento mudar e me transformar em alguém mais dócil e conformada com as circunstâncias e com os rumos que minha vida tomou, só que a inconformidade também faz parte do meu eu, é da minha essência.
E isso é o que não me deixa, por exemplo, sentar numa poltrona e ficar olhando o dia que vai passando, as horas escoando, lentamente, enquanto o vento, lá fora, balança os galhos das árvores.
Nesses momentos, penso naquela frase do Chico Xavier que diz o seguinte:
Embora ninguém possa voltar atrás e fazer um novo começo, qualquer um pode começar agora e fazer um novo fim.
Que frase sensacional!
Ou seja, o passado não tem remédio, está aí, faz parte do seu show e dele não tem como escapar.
Mas olhar para a frente, recomeçar e mudar tudo, isso podemos.
E, dependendo do caso, devemos.
Olhar bem para dentro de nós mesmos e buscar as respostas sobre aquilo que queremos e almejamos, arregaçar as mangas e sair à campo.
Ficar de braços cruzados olhando a caravana passar é que não dá.

Excelente final de semana a todos!

Cineminha Básico

Sempre gostei de ir ao cinema e a primeira vez que assisti a um filme na telona foi em companhia de minha Mãe Maravilha, que sabia das coisas, vi A Noviça Rebelde, tinha 7 anos e nem conseguia ler direito as legendas, que ela repetia em voz baixa para mim.
Um sucesso!
A partir daquele debut, nunca mais deixei de ir ao cinema e faço-o com um prazer enorme.
Programa que sempre fez parte de minha vida, até quando era estudante e pobre de marré marré não deixava de curtir um  cineminha básico em Porto Alegre, tinha o Vitória, na Borges esquina com a Rua da Praia, o Baltimore e o Bristol,  na Osvaldo Aranha, o Coral, na 24 de Outubro, a Sala Vogue, na Independência, o Avenida, na João Pessoa esquina Venâncio Aires, e ainda outros, de cujos nomes não me recordo agora.
Já andei visitando salas de cinema em Buenos Aires, Piriápolis, Rio de Janeiro e até em Paris um dia fui, vejam só.
Que mulher pedante, dirão.
Nada disso: apenas entendo que ir ao cinema é uma forma de alimentar a fome de cultura e conhecimento que a gente tem, além, é claro, do programa que, por si só, é muito bom.
Tudo no cinema é mega, a começar pelo som, inclusive as propagandas,  que também passam na TV adquirem, no cinema, uma dimensão totalmente diferente, é maior, é mais bonito, es divino.
Feliz, aí está o adjetivo que estava faltando para definir o que sinto quando vou ao cinema e  vejo um filme bem feito, com uma história que vale a pena conferir, fotografia boa, música linda.
É um espetáculo e nada tem a ver com  filme que a gente assiste em vídeo, dentro de casa, nada mesmo!
Aliás, quem sabe, talvez, num dia de chuva com temperatura abaixo de zero eu me empolgue e queira ver, por exemplo, 12 anos de Escravidão em casa, no sofá, com meu grande pantufão.
Nem pensar, é a treva!
Gosto muito da minha casinha, meu lar doce lar, mas também adoro uma rua, olhar o movimento das pessoas e sair, mudar, alterar a rotina.
Um bom filme perde muito quando visto assim, mesmo que a TV seja enorme não adianta nada, por que o bom do cinema, além  da tela e do som, obviamente, é o entorno: o café, a pipoca, o pãozinho de queijo quentinho, o refri.
Um prazer e tanto, é ir ao cinema.
Por essas e outras, hoje pela manhã, quando escutei uma colega dizendo que nunca tinha ido ao cinema, não conhecia e, portanto, não poderia opinar sobre as diferenças de imagem e som entre um filme e outro, emudeci.
Muda, fiquei muda.
É...
The end.







quinta-feira, 26 de junho de 2014

A Onda Cinza

Venho observando, e faz tempo, que muitas casas estão pintadas de cinza e suas variações: cinza claro, mais escuro, chumbo, meio lilás, mas, de qualquer forma, cinza.
Confesso que não entendo essa moda de pintar casas e pontos comerciais com uma cor que, a mim, lembra tristeza e baixo astral, por mais que digam que é chique.
Aliás, não é moda, é tendência, essa é a palavra correta para definir a questão.
Tendência.
Tá bem.
Não me importa a expressão e sim, a cor.
De igual modo, uma propaganda de determinado partido político aparece mostrando seus candidatos de lado, falando para um interlocutor que a gente não enxerga, eles não olham de frente para a câmera.
E o fundo é cinza.
Desnecessário dizer que não voto em candidato que, primeiro, não olha de frente e, segundo, tem às costas um painel cinzento.
Não me passa uma boa impressão, menos ainda uma mensagem clara.
Soa como algo soturno e, de coisas lúgubres, disparo.
Não entendo o que leva os profissionais a fazer esse tipo de coisa.
Vai ver, estou completamente fora dos padrões, considerando que pintei minha casa de uma cor entre o laranja e o salmão,  para escândalo dos arquitetos cinzentos, e minha calçada é bege: outro escândalo.
Bonito, mesmo, fino, é que tudo seja cinza, inclusive a calçada.
O carro.
O muro.
A vida.
Não!
Se porventura tivesse que morar numa casa cinza, teria uma síncope!
As cores, para mim, transmitem energia.
Por isso, depois de cinco dias com este céu cinzento e emburrado e a neblina fininha caindo sem parar, ando pensando seriamente em me mudar para o Nordeste.
Abaixo a tendência cinza, que a vida pede mais cor!




Santo Remédio

Mariana estava saturada da vidinha idiota que vinha levando.
Chegara aos quarenta e a crise existencial abatera-se sobre ela com uma força tremenda, nada do que havia conquistado parecia suficiente, achava tudo errado e não se conformava com o tempo que, a seu ver, desperdiçara.
Saíra de um casamento completamente arranhada e emocionalmente exausta, os cabelos tinham branqueado e duas finas rugas, aliás, nem tão finas assim, toldavam-lhe o semblante.
Antes risonha e faceira, Mariana andava séria e engordara muito, vivia devorando pasteizinhos e bombons sem qualquer critério, a fim de suprir a falta, de preencher o vazio.
Se antes sua vida era chata, agora era um deserto, uma seca sem fim, não aparecia ninguém para alegrar seu dia e muito menos seu corpo solitário, sedento por um abraço y algo más, que ninguém é de ferro e ela já estava naquela há vários meses.
Começou a prestar atenção ao seu redor, primeiro nos colegas de trabalho, depois nos amigos, mas não pintava nada, nem pra remédio. Muitas vezes ela sentia-se como se fosse um ser assexuado, não sabia muito bem como dar início aos trabalhos e aos jogos amorosos, e ficava naquilo.
Batia longos papos com sua amiga Rose, que, por seu turno, dava-lhe força e apoio na medida do possível.
Até que um dia decidiu mudar.
E mudou, pois deu-se conta que a revolução tinha que começar de dentro para fora.
Decidida, jogou no lixo a caixa inteirinha de bombons finos que tinha comprado recentemente, aboliu os pasteizinhos do café que frequentava diariamente e começou uma dieta radical.
Sim, radicalizar era preciso.
Procurou uma academia de ginástica e partiu para as aulas de aeróbica de segunda a sexta, nos primeiros dias nem teve coragem de mirar-se no espelho, voltava para casa destruída, mas estava começando a sentir-se bem melhor.
Esvaziou o armário e fez uma doação geral, foi numa loja e comprou muitas coisas novas, diferentes.
A Mariana estava ensandecida.
Possuída.
Ainda não...
Como uma coisa puxa outra, começou a formar uma nova turma de amigos, saiu da toca e, enfim, depois de muito tempo, encontrou o que procurava.
Tirou férias, foi para a Europa e, quando voltou, estava irreconhecível: magra, bronzeada, sarada e feliz.
A amiga Rose, os colegas do trabalho e muitos outros, espantados com a sensacional  mudança, não deixavam de perguntar:
Mariana, o que fizeste para ficar tão bem? O que andas fazendo?
E ela, sorridente, respondia:
É simples, meus amigos: ando beijando muito!
Santo remédio!





Cosas de La Copa

É Copa do Mundo e não adianta, até tento ficar indiferente, dependendo do jogo, mas não tem como ignorar um evento desse porte.
Ademais, não bastasse a Copa em si, acontece cada coisa que até Deus duvida, mesmo Ele sendo brasileiro.
O que foi aquela mordida do Luizito Suárez no ombro do outro cidadão? em vez de beijinho no ombro, pro recalque passar longe, pois o Uruguai está classificado, o camarada mete uma baita dentada em outro homem, em pleno campo de futebol, no meio do jogo, em uma partida pela Copa do Mundo.
Quem pode entender uma coisa dessas? Esse próximo tem um problema sério, de ordem psicológica, fiquei curiosa e até vou pesquisar o que leva pessoas a morderem outras, ele, particularmente, já teria feito isso em duas ocasiões e agora foi suspenso, o que está corretíssimo, se não consegue ficar sem dar uma mordida em alguém, que compre uma focinheira e vá se tratar!
Outro caso, este da Copa anterior, foi o do técnico da Seleção da Alemanha tirando pão do forno e levando à boca aquela bolinha que havia feito...mas creeeedooo! Põe relaxado nisso, quando ele apareceu desta vez, imediatamente lembrei daquela imagem que correu o mundo, algo tão vergonhoso para um adulto quanto nojento.
Também deve sofrer de algum transtorno, tenho certeza disso, e de tal monta, que não se conteve e acabou fazendo aquilo em público, também dentro do campo, também em plena partida de Copa do Mundo.
Tomara que, nesta Copa, não repita o gesto; entretanto, volta e meia, ele coça o nariz...
Mas a cena dantesca que levou todas as fichas foi aquele comboio escoltando um veículo cheio de dinheiro, para ser entregue aos jogadores de Gana, que já tinham ameaçado não jogar se não recebessem.
Como pode?
Incidentes isolados que chamam a atenção mas que, em momento algum, tiram o brilho da festa, que está linda: estádios lotados, gente feliz, fantasiada, extasiada com a beleza dos jogos e dos bons momentos que o futebol proporciona, uma integração maravilhosa entre os povos.
Perfeição não existe, como registrei anteriormente, muitos desvios ocorreram, mas a esmagadora maioria trabalhou, varou noites, finais de semana, muita tensão e uma cobrança infernal.
A Copa do Mundo do Brasil, até agora, é um sucesso estrondoso!
A grama do vizinho sempre é mais verde, mas nós, brasileiros, deveríamos nos orgulhar de ter a capacidade de oferecer para o mundo algo assim.
Espero que os governos usem a mesma criatividade, disposição e força de vontade que tiveram em relação a Copa para por fim, em definitivo à miséria, à pobreza, à falta de educação e de saúde, entre outras tantas carências do povo.
Nós podemos!





quarta-feira, 25 de junho de 2014

Recalque Mondadori

Definitivamente, eu lido muito mal com as frustrações, aliás, não lembro quem foi que me apresentou, certa feita, uma frase do tipo é preciso aprender a lidar com a frustrações, provavelmente algum chato de galocha com aquele papo politicamente correto que abomino, mas, vá lá.
Não consegui, até a presente data e apesar dos incontáveis tombos que levei por esta vida afora, descobrir a fórmula mágica que me deixaria calma e tranquila e serena e com cara de paisagem cada vez que levasse um não assim, bem no meio da cara.
Afffffff!
Se alguém souber, por favor, onde encontrar esse produto que acalma cada vez que você deseja ardentemente alguma coisa e não pode obtê-la, me avise, pago bem.
Têm dias que a gente sente uma vontade louca de sair para fazer o que tem vontade, sem se preocupar e como se não houvesse nada mais importante, a não ser o que a gente quer, um belo dia resolvi mudar, e fazer tudo que eu queria fazer, me libertei daquela vida vulgar, etc...
Eu sou fanática pela Seleção Argentina e isso não é segredo para ninguém, talvez Freud explique e se ele não explicar também não importa, fato é que soy alucinada por la celeste y blanca.
 E isso me fez desejar ir pro Portinho, estar lá, no meio da massa, nesta quarta feira, gritando e cantando junto con los hernmanos, ingresso nem pensar, tentei há meses e não consegui, mas só de estar ali junto com o povo seria suficiente, e aquela ideia começou a tomar corpo e atingiu uma proporção muito grande dentro de mim, a tal ponto que liguei para a rodô e reservei minha passagem, faria uma viagem meio suicida, iria terça à noite, voltaria quarta à noite, passaria o dia, talvez precisasse chamar o SAMU pra me levar até a rodoviária de Porto Alegre ou me buscar na chegada, aqui em Itaqui.
Enfim, passei boa parte do final de semana sonhando com isso e em ouvir aquelas músicas que a torcida argentina canta, vamos, vamos Argentina, vamos, vamos, a ganar, que esta barra quilombera no te deja de apoyar!, meu Deus do céu, queeeeee músicaaa sensacional!!!
Até parece a torcida brasileira, que há décadas canta o mesmo samba de uma nota só, desculpem minha sinceridade.
Mas aí, uma amiga muito chata que eu tenho, aliás, insuportável, chamada Realidade, começou a falar comigo, primeiro, como quem não quer nada e,  sem querer querendo, veio me lembrar  que o jogo seria numa quarta feira.
Como sair do trabalho em plena quarta feira? Chegaria para meu Chefe e diria, e aí, Chefia, última forma,  tô me mandando pro Portinho porque soy loca por Argentina y quiero estar allá, sabes, gritando mucho, vou faltar quarta e quinta e, de repente, dependendo da festa, volto só segunda que vem...
Legal, né?
E a amiga continuou me cutucando, é final de mês, tá com pouca grana, vai fazer como? A passagem é cara...
Mas vida de pobre é fumeta, mesmo!
Como vocês já se flagraram, não fui.
Hoje amanheci com uma raiva do tamanho do mundo, e nada ajudou, a começar pela TV, que mostrava ininterruptamente as imagens dos hermanos festejando, enlouquecidos.
Eu, olhando aquilo, séria que nem guri cagado, nem vontade de ver o jogo me deu, pior que não ir à festa é ver os outros festejando e você ali, do lado de fora.
Ou melhor, a 730 Km!
Olhei o jogo, aguentei firme mas, quando terminou, desliguei a TV com uma dor de cabeça daquelas, fechei a cara, juntei o pouco de sanidade mental que me restava e fui tomar um banho pra acalmar os nervos e a fúria.
Deu certo.
Ainda bem, pois estava a ponto de ir até o Cartório do Registro Civil para mudar de nome:
Recalque Mondadori, esse é o nome da fera!



sábado, 21 de junho de 2014

Astral de Candidato

Embora estejamos em plena Copa do Mundo - e, no Brasil, o que é fantástico, em que pese todas as falcatruas que devem ter rolado, temos que admitir que muita gente trabalhou duro e de forma honesta, aliás, a esmagadora maioria, disso não me cabe dúvida - é ano de eleições e os futuros candidatos andam a mil pelo Brasil.
Tem um negócio que ronda minha cabeça há dias, e quero dividir com vocês, meu adorado fã clube de meia dúzia de gatos pingados: o candidato não pode ser mal humorado.
Ou pode?
Não pode.
Quem quer voto não pode ficar de cara feia e muito menos tratar mal o eleitor, seja o que já abriu seu voto e anda com adesivo colado na lapela, seja com aquele que ainda está em cima do muro, observando a cena.
Com esse último, então, nem se fala!
Candidato que se preze tem que gastar todo seu latim para convencer o eleitor que sua proposta é boa, que suas ideias são fantásticas e que ele, e só ele, é a solução para todos os problemas que afligem sua comunidade e sua região. Todos os demais são bons: ele é o melhor.
Entretanto, tem candidato que se acha, que pensa que já ganhou por que tem uma legião de pessoas que admiram seu trabalho, que curtem tudo que ele posta nas redes sociais e, também, em razão da sempre presente turma dos puxa sacos, cujo cordão cada vez aumenta mais, como diz a marchinha.
Não entendo assim, s.m.j.
Um candidato que se apresenta com ares de superioridade e, pior ainda, trata mal algum eleitor apenas porque o mesmo não vai votar nele e sim em outro candidato, para mim, já perdeu.
Perdeu a chance de reverter aquele voto com argumentos sólidos
Eu, particularmente, presto muita atenção a um bom argumento. Paro tudo e posso até rever posições, dependendo.
Mas se tem uma coisa que não suporto, é falta de educação.
Meu voto é sagrado, é meu e bem meu,  voto em quem eu quiser, ainda não nasceu quem vai me dizer em quem devo votar,  mas não mesmo!
Acima de tudo, voto em quem eu acredito e respeito.
E de candidato brucutu e baixo astral, passo longe.
Se está assim antes de ser eleito(se o for), imagina na Copa!



Noche de Ronda

Costumo me exibir e propalar, aos quatro ventos, que não sofro de insônia, um mal que aflige muitos amigos meus, os quais, cada vez que o assunto vem à baila, ficam a olhar-me se soslaio, com um misto de inveja e raiva, pois imagino o quanto deve ser terrível passar a noite revirando pensamentos e buscando um sono que não vem.
Imaginava, devo dizer, pois ontem à noite, aliás, hoje pela madrugada, tive minha dose de remédio amargo.
Minha filha Marina foi passar o feriadão em Alagoas, seu voo estava marcado para sair de Porto Alegre às 9 da manhã de ontem e saiu às 12h.30min., ela chegou em São paulo às 13h30min., de onde me ligou, avisando, para que eu não me preocupasse, pois tudo havia atrasado em função da neblina e somente às 23 horas ela embarcaria para Maceió.
É mole ou quer mais?
A partir dali, minha mente produtiva começo a funcionar e eu já sabia, uma vez que me conheço bem, que não teria mais 1 minuto de sossego até que a criatura chegasse ao hotel.
Foram horas e horas de pensamentos desagradáveis, tenho propensão a teorias da conspiração, tentei me distrair durante a tarde e até lá pelas 23h, horário da decolagem, mas depois, não tive saída a não ser encarar uma noite gélida e uma madrugada tensa.
Um frio de renguear cusco e eu ali, sentadita no sofá, esperando, tentando não olhar para o relógio que, obviamente e só para me irritar andava mais lentamente que de costume, e nem adiantou tomar meu popular Cereus Purpúreos, o tradicional remédio de china velha, como dizia meu Pai, talvez eu precisasse, mesmo, de uma dose desses calmantes faixa preta que não tenha em casa, pois minha parca farmácia doméstica consiste em  sal de frutas e aspirina - simplesmente ridículo, dadas as circunstâncias.
Vieram-me à cabeça tantas histórias absurdas que nem vale a pena comentar,  vou guardá-las para um futuro romance de suspense e tragédia, tal o grau de requinte das asneiras que pensei.
Cantei mentalmente várias músicas, lembrei de uma, do tempo da faculdade, que dizia mais ou menos assim:
No meio da noite, quando eu tenho insônia
Fico lendo um velho jornal
Que é pra ver se durmo, antes do amanhecer
E conto ovelhas, danço com fantasmas
Numa dança sem emoção
E no fim das contas, pelas circunstâncias
Volto a me lembrar, de ti...
E por aí segue.
Fato é que, sim, dancei com todos os meus fantasmas, apareceram amigos do tempo da carochinha que nem eu mesma lembrava e estava crente que havia sepultado em definitivo, que nada daquilo importava mais na minha vida.
Ledo engano!
Nada como uma madrugada insone para colocar ideias em ordem, ou, talvez, numa saudável desordem, porque às vezes é preciso, mesmo, zerar tudo e recomeçar.
Mas põe insônia nisso!
Tornei-me filosófica,  refiz meu trajeto de 53 anos e dei tantos giros que dava pra ir de voltar de Maceió umas quantas vezes!
Às 4 da matina, recebi a ligação redentora, minha filha falava ao telefone como se fossem 10 da manhã, lépida e faceira, deslumbrada com a beleza de seu hotel e da praia que se estendia a sua frente.
A partir dali, caí num sono profundo,  sem sonhos nem fantasmas, esses foram embora e espero que para sempre, se bem que, de alguma forma, me ajudaram, soprando em meus ouvidos algumas verdades que somente uma noite insone é capaz de trazer.
Ainda não digeri muito bem tudo que passei nesta madrugada, mas uma coisa é certa: quando vi o Sol fantástico e o céu azul, não pude deixar de agradecer a Deus por ter conseguido vencer mais esta travessia!



quinta-feira, 19 de junho de 2014

Genros Padrão Fifa

Minhas duas filhas, a mais velha e mais nova, respectivamente,  namoram dois caras bacanas, são aqueles genros que toda mãe pediu a Deus: são guris bons, honestos e trabalhadores, mega companheiros delas e, como se não bastasse, tem muito senso de humor. Riem adoidado das palhaçadas da sogra, não sei se por educação ou porque acham graça mesmo, fato é que nos divertimos muito quando estamos todos juntos.
Completando o quadro, têm famílias muito legais, com quem também passo bons momentos quando estou no Portinho.
São amizades e afetos que a gente vai costurando ao longo da vida, independentemente do que o futuro reserve a essas duplas, em relação a isso não opino, apenas torço: torço para que o amor prevaleça sempre, para que a amizade e o carinho sejam a tônica entre eles e, fundamentalmente, o respeito.
Eles são alegres e estão sempre por perto para me abraçar cada vez que nos encontramos, a gente tem uma sintonia muito boa, seja para tomar um montão de cervejas ou de vinho, ou um bom matecito, meus guris são grandes parceiros.
E digo meus guris, porque não tive filhos homens e, às vezes, a gente quer o abraço de um filho.
O amparo de um filho homem, que vai tomar as dores pela mãe.
Não que minhas filhas não o façam, nem o maridão, mas com filho é diferente.
Deve ser.
Mas eles, o Adriano e o Pedro, eles são os filhos homens que não tive e que agora tenho, e isso me traz uma sensação maravilhosa.
Imaginem vocês, meus queridos amigos que ontem, em plena festa da Copa e na junção de um bar do Portinho, me ligaram e gritavam que era para eu ir para lá, que eu tinha que estar lá.
Meu coração ficou louco de alegria com essa declaração de amor dos meus dois genros para mim, fiquei me
achando a última bolachinha recheada do pacote, a sogra que todos pediram a Deus, é, fiquei muito feliz mesmo.
A vida tem suas compensações, e meus dois genros são a prova disso.
Genros lindos, genros padrão Fifa!

segunda-feira, 16 de junho de 2014

Ida Ao Dentista

Para mim, ir ao dentista é algo como uma odisseia no espaço, não gosto, abomino.
Não é medo, é trauma, e nem vou contar a vocês os detalhes sórdidos, que não vem ao caso.
Minha consulta estava marcada para hoje, tinha que ser hoje, e de hoje não podia passar, ponto e fim de linha.
Convidei o Juruna pra ir comigo e é obvio que ele não quis...garoto esperto!
Parenteses: certa vez fiz  essa piadinha do Juruna, mais velha que andar para a frente e minha amiga, de olhos esbugalhados, perguntou: Juruna? Que Juruna? Ai meu Deus do céu, ela não sabia quem era o Juruna!
Detalhe técnico: meu dentista fica em Uruguaiana e, para meus amigos de longe, explico: Uruguaiana fica a 90 Km de Itaqui.
O dia amanheceu tão emburrado quanto eu: cara fechada, escuro e uma neblina fria e fina completavam o quadro.
Saí, não sem antes, na hora da arrumação, colocar minha corrente com o pingente de São Jorge que minha filha Rita me deu, mas confesso que fiquei na dúvida, São Jorge ou Nossa Senhora Aparecida? Optei por São Jorge, afinal, estava indo enfrentar o dragão, aliás, o dentista.
Brincadeira, meu dentista é um homem finíssimo, profissional super competente e conhecido em toda a região, excelente pessoa.
A sequelada aqui sou eu.
Rumamos, meus CDs, meu mau humor, o dia feio e eu a Uruguaiana, até pensei em colocar um cedezinho mas o clima, dentro e fora do carro, não combinava com nenhum tipo de música, apenas com meus resmungos.
Sentei como sempre sento na sala de espera e começo a procurar meu terço dentro da bolsa e a pedir que me protejam e ali fico rezando com cara de ré, imaginem o tamanho do fiasco.
Eis que abre-se a porta e surge o dra...,  naõooo, o dentista.
Eu tento sorrir, claro, melhor que nunca tenham me filmado numa hora dessas, devo ter saído com uma cara horrorosa.
Hoje foi diferente.
Mal entrei na sala, uma imensa bandeira da Argentina estava posta sobre a bancada.
Bandeira da Argentinaaaa, moríte!
Esse fato já me fez relaxar quase que completamente, mais ainda quando ele, todo feliz, me disse que torce para a Argentina, que é fanático pela azul y blanca...resumo da ópera: anestesiei sem tomar anestesia, se é que me entendem.
Aquele papo sobre la pátria teve um poder sobre mim melhor que muito anestésico, não senti nada e, quando vi, terminou, tchau, até a próxima.
Saí dali em estado alfa, passei na padaria, onde comprei uns biscoitinhos,  e me mandei pra Itaqui.
Na estrada, vinha rindo à toa e, iniciando a seleção musical, Natiruts, que é só alegria.
Quando passei pela ponte do Ibicuí, o Sol cintilava sobre as águas.
Para arrematar, What a Wonderful World, na voz de Rod Stewart, mas aí sim, viajei legal, fui até o Chile, dei uma volta por Bariloche, me encantei com as montanhas e com a neve,  e voltei.
Dentista?
No se, me olvide, ni me acuerdo.

Ótima semana a todos!


sábado, 14 de junho de 2014

Squadra Azzurra

Nem só pela  Argentina bate este coração.
Lembro-me bem que meu avô paterno, Atílio, torcia enlouquecidamente pela Itália, a toda certeza recordando seu país de origem, de onde saiu, rumo a América no final do século IX a bordo de um navio onde passou " las de Caim", como diria minha Mãe, mas isto será objeto de outra postagem, que o assunto hoje é Copa do Mundo e nem poderia ser diferente.
Por mais que tenhamos votado contra, da aberração dos gastos astronômicos, somos traídos pelo sentimento de nacionalidade, que faz o coração da gente vibrar e  não tem escapatória.
Mas o que eu queria referir é que essa animação toda em copas do mundo vem de família, tanto pelo lado materno, onde los argentinos eram loucos por el fútbol, quanto pela turma dos italianos, a família do meu Pai.
O Avô Atílio, na condição de chefe supremo, fazia questão de reunir  todos na sala de jantar de sua casa, que era, simplesmente, enorme, vinte pessoas sentavam-se, comodamente,  e ninguém ficava sem espaço.
Meu Avô era um homem alto, cuja força e o poder concentravam-se  no olhar.
Foi embora em 1972, mas deixou um legado de amor pela Itália que nenhum de seus descendentes esqueceria.
E lá estávamos nós, olhando o jogo da Copa do Mundo de 1982, salvo meus avós: eram seus  filhos, nora e netos, como seria do seu gosto.
Minha tia Alba, que comandava a casa desde que minha avó Mathilde fora embora mandara preparar um sem fim de iguarias, acho que argentinos e italianos descontam o nervosismo comendo.
Comendo e gritando.
De vez em quando, rolava um tabefe em alguém, ou um palavrão.
Sentiu a função que um grupo de 20 italianos, uma argentina e seus filhos conseguiam produzir?
Ficou surdo?
Levemente tonto?
Normal, a gritaria beirava o insano.
Quando da vitória da Itália, nós nos abraçamos, choramos juntos de alegria e esvaziamos todas as garrafas de vinho, todos as travessas de comida e meu tio Carlos Alberto deu a senha: abre o champanhe mais caro da adega, a saúde de " la nostra Itália!"
E assim dançamos, como uma penca de loucos por um bom par de horas, com todas as luzes da casa acesas, numa iluminação feérica.
Uma justa homenagem ao Avô Atílio que, se ali estivesse, estaria sorrindo e com os olhos cheios de lágrimas, e a Squadra Azzurra, simplesmente espetacular!





Fogo Na Lareira

Aprendi com meu Pai a fazer fogo na lareira, e deveria ter lá meus seis, sete anos.
Modéstia à parte, faço-o bem. Bem, e rápido.
Minha casa paterna tinha uma lareira imensa, feita de pedras especiais, era larga e alta, cobrindo-a havia um tampo de madeira de lei que deveria ter uns 20 centímetros de espessura, onde descansavam os enfeites de cobre de minha Mãe.
Na parede acima da lareira, um fabuloso quadro de um artista local, o grande Jorge Vômero, com a figura de um toureiro e seu manto vermelho, numa gama de cores que iam do vermelho escuro ao laranja,  e tinha tudo a ver com aquele cenário: fogo, cor, calor.
Desde sempre vi aquela lareira funcionar, e meu Pai sair até o fundo do pátio para enfrentar os dias gelados do inverno,  lá pelas 16 horas, com um carrinho de mão para nele colocar os troncos, as lenhas mais finas e os gravetos.
Eu andava ao lado dele, observando cada detalhe de seus movimentos, que guardo até hoje, conversávamos animadamente, ele sempre rindo, olhava para mim e dizia, viu Chininha querida, vamos fazer um fogo daqueles! E ria.
Ele era mesmo uma felicidade ambulante, meu Pai gostava de viver e adorava a vida que levava, estava a todo momento a repetir,  China querida, no te preocupes, Deus proverá!
Suas mãos carregavam a lenha para dentro do carrinho, que vinha equilibrando em razão do peso, até  a calçada que dava para a porta da sala.
Essa tarefa de ir e vir com o carrinho de mão, fazia-o diversas vezes até formar uma pilha de lenhas que ficavam encostadas na parede externa da sala, de onde saía  a chaminé, acho que teria uns 8 metros de altura, com seus ladrilhos vermelhos e brilhantes, um espetáculo a parte.
Finalmente, acomodava engenhosamente os pedaços maiores, um de cada lado da lareira, no meio muito jornal amassado e, por cima, cuidadosamente postos, os gravetos e as lenhas mais finas.
Uma obra de arte, era aquele fogo!
Ele não o acendia  antes do final do dia, nunca. Esperava cair a noite e quando apontava a primeira estrela no céu invernal, não sem antes ter aprontado seu mate, postava-se solenemente na frente da lareira e iniciava o fogo, que começava a pegar pressão lentamente, até  transformar as lenhas em brasas que cintilavam e, a medida que iam sendo consumidas, ele acrescentava outro tanto de lenha, e assim íamos, até a hora de dormir ele, minha Mãe e eu, sentados em círculo, cada um com seus pensamentos e sonhos, admirando aquela cena.
 A cadeira de balanço era a favorita de minha Mãe, o pai contentava-se com qualquer uma, o que ele queria, mesmo, era ficar ali em volta do fogo, saboreando seu mate.
Tive uma infância feliz!
Feliz é eufemismo, minha infância foi extraordinária, graças a Deus, cercada que fui de amores por todos os lados, amores esses que me tornaram o que hoje sou.
Como sempre digo, carrego no coração um fantástico manancial de boas lembranças.
E agora, para não fugir à regra e nem à tradição, sentar-me-ei na frente da lareira acesa,  com suas toras grandes, uma de cada lado, muito jornal amassado no meio e uma pilha de gravetos e lenhas finas, cuidadosamente postos, para saborear meu matecito especial.
No puedo dejar de pensar como la vida es buena!








Tatu Com Molho

Num dia de inverno, ou de verão, não importa o clima e sim a vontade, tem dias que amanheço com animus  de me aventurar na cozinha.
Hoje, com o frio de rachar que faz na Fronteira Oeste,  quis fazer nhoque.
Com muito molho e uma carne bovina chamada tatu, ou lagarto. Aqui no Itaqui, desde sempre, conheço por tatu.
É uma comida que requer paciência e tempo para ficar no ponto, aliás, não há nada mais aborrecido que cozinhar a toque de caixa, correndo, esse modus não combina nem nhoque e muito menos com tatu.
Que não dizer, então, de um glorioso sambayón - mas isso é sobremesa, e o assunto, hoje, é o almoço.
Tudo começou ontem porque estava com uma saudade tremenda de minha filha Marina, a Engenheira Química que, com 24 aninhos, anda fazendo sucesso na empresa onde trabalha, a John Deere.
A Marina adora um tatu com molho e, como ando saudosa desta minha filha que, se Deus quiser vai chegar no Itaqui daqui a 5 dias, pensei, vou fazer um tatu em homenagem a minha Jurinha - seu apelido, e assim foi.
Só que sou maniática.
Antes de dar início aos trabalhos, começa todo um ritual, que vai desde limpar a cozinha, uma vez que não sei cozinhar com nada sobre a pia, apenas meus ingredientes, até o avental, sempre a postos na gaveta à espera do próximo faniquito culinário de sua dona.
Corto todos os temperos, coloco a panela de ferro que foi de minha Mãe  no fogo,  com apenas uma lista de azeite e uma pitadinha de açúcar para aquecer,  e solto o tatu inteiro ali, não sem antes tê-lo temperado com alho e sal.
Ele vai fritando e se virando, até ficar dourado.
Então, acrescento cebola, pimentão e tomate, uma folha de louro, baixo a chama e deixo.
Dito assim, parece simples, mas não é.
O tatu tem seus segredos e esses eu não vou compartilhar com vocês porque me foram passados pela minha Avó materna Adelaida e pela minha Mãe maravilha, que fazia nhoques e um tatu com molho como ninguém e eu, esta simples mortal, tenho a doce ilusão de manter a tradição familiar e fazê-los tão bem quanto elas, quem sabe, aproximado.
É, pode ser que eu tenha conseguido chegar perto daqueles pratos escandalosamente divinos que minha Avó e minha Mãe preparavam.
Pode ser...
Quem sabe.
De uma coisa, sei: não dá pra cozinhar correndo, salvo arvejas con huevo, mas essa aí é outra receita.
Notável é que, enquanto a carne vai cozinhando na panela, os sabores vão nos levando às lembranças, e de tal forma que, quando nos damos conta, está quase tudo queimando, uma vez que o pensamento flui e voa até onde estão as mais lindas recordações que guardamos dentro do coração.
Por sorte ou arte de magia, voltamos ao local onde estamos: a cozinha de casa, e a comida é salva por alguma mão milagrosa que nos traz de volta, apenas para mostrar que tudo que aprendemos nesta vida não é em vão mas, principalmente, que o que é feito com amor e carinho é garantia de sucesso.
Meu maridão comeu com aquele ar de felicidade e alegria que deixa seu semblante sorridente, e até minha secretária que, de início, estava emburrada comigo na cozinha onde ela reina absoluta, deu o braço a torcer e ficou murmurando, tá bom, báááá...
Ainda bem que sobrou uma lasquinha para o jantar!

Um final de semana muito bom a todos!
.

sexta-feira, 13 de junho de 2014

Românticos

Não há desculpa para não ser romântico, e a falta de romantismo sepulta qualquer amor.
Se o amor estava mais pra lá que pra cá, o ser que não é romântico dá o empurrão que falta para que você saia, em definitivo, daquela relação morna e sem graça, um pirão sem sal, um arroz empaçocado e aguado, sem o menor gosto.
Não há desculpa que sirva para a falta de romantismo, a não ser a única que realmente cola e a que a maioria dos casais se recusa a enxergar, por que a verdade dói: o amor acabou.
Simples, banal, até.
Coisa nenhuma.
Não há banalidade em um relacionamento que termina, não é bom, sempre ficamos com a sensação  de fracasso, ou de culpa, ou de que não fizemos o que poderíamos ter feito no tempo certo e aquele tempo acabou.
Não há desculpa esfarrapada que justifique a falta de romantismo.
Não serve a mais usual de todas: não tenho grana. Então vai lá numa pracinha qualquer, ou num murinho onde brotam aquelas rosinhas pequenas, e colhe um buquezinho  para o seu amor.
Não tive tempo: infame! Para o amor sempre temos tempo, salvo quando não nos interessa mais.
Pior fica se a pessoa tem um salário razoável no final do mês: não sobrou nem um pila pra comprar, que fosse, uma caixa de bombons no supermercado ou no armazém da esquina? Um pacotinho de balas de coco, um tijolinho.
Nada de nada.
Isso é a treva, é o cúmulo!
Sem romantismo, não há relacionamento que resista aos embates do dia a dia.
Ao menos disfarça um pouco...
Não. Quem não é romântico não se flagra que aquela falta de acarinhamento poderá  ser a pá de cal.
Cheguei à conclusão de que não há meio romântico: ou é, ou não é.
Ou é grosso que nem dedo destroncado ou é um daqueles de tirar o fôlego, e para isso, basta um gesto, que somente quem é romântico e entende do riscado sabe como fazer.
Tem muito homem que pensa que, em razão da igualdade feminina, não precisa fazer mais nada ou, pior ainda, fica achando que as mulheres têm que fazer.
Têm mulheres que pensam que, por estarem junto com o cara há tempos tampouco necessitam demonstrar nada em data nenhuma.
Ledo engano.
Uma mulher, por mais auto suficiente que seja, continuará sendo mulher, e nada será capaz de apagar essa condição.
Quem não for capaz de entender isso será, além de burro, mal intencionado.
Por outro lado, uma mulher que pensa que sabe  tudo sobre o seu amor e nem precisa comprar um chocolatinho no Dia dos Namorados talvez se surpreenda se, um dia, do nada, levar um pé.
Não terá sido do nada.
Tudo tem uma motivação.
Pode ser o somatórios das solidões amargadas, da flor que não recebemos, da surpresa boa que deixamos de fazer.
O Dia dos Namorados foi ontem, já passou.
Mas, e hoje?  você já beijou o seu amor hoje? Beijo, beijão, beijasso?
Pois é...
Movete!






quarta-feira, 11 de junho de 2014

Portas Entreabertas

Não há, neste mundo, nada mais cruel que uma porta fechada, batida assim, sem mais nem menos na sua cara, no seu nariz.
Dependendo da porta, atinge diretamente seu coração.
É um coice no estômago, tira todo o rumo, o prumo e a direção de quem está do outro lado.
Há 11 anos, experimentei essa sensação tremenda.
Fazia uma semana que minha Mãe tinha ido embora quando passei pela suprema amargura não poder entrar na casa de meus Pais, na casa que até alguns dias havia sido minha.
Não houve dor maior, depois da perda, que a de ver a porta da casa paterna fechada e trancada à chave.
Bloqueada.
Mas, é bom que se diga, para mim.
Apenas para mim.
Essa é uma lembrança que carregarei para o resto dos meus dias e não pretendo esquecê-la.
Não quero.
Perdoar não significa esquecer.
E tem coisas nesta vida que, embora dolorosas, não podemos perder de vista, mesmo que fiquem ali, guardadas a um canto da mente, porque deixar de lado as barbáries a que nos submetem gratuitamente é o mesmo que esbofetear a nós mesmos, e isso é algo que não se pode permitir.
Entretanto, a porta fechada sempre deixa uma fresta por onde escapa uma nesga de luz.
Sempre.
Mesmo que não consigamos enxergar a luminosidade, cegos que estamos pela dor, ela se mantém ali, constante, até que um dia, um belo dia, vemos.
Vemos uma outra porta entreaberta e, a partir dali, a claridade recomeça a ser, novamente, uma constante em nossas vidas.
É bem verdade o ditado que diz que Deus fecha uma porta e abre uma janela.
No meu caso, Ele me disse:
" Apesar da porta que te foi fechada, dar-te-ei tantas outras, para que possas abri-las, porque te fiz capaz".
Desde aquele dia infausto, reabrem-se, em minha vida, inúmeras portas.
Diariamente.
A força que faz com que vençamos a dor e olhemos para o interior da porta entreaberta é a mesma que nos mantém vivos.
A energia que nos leva a abri-la para ver a luz é Deus.





terça-feira, 10 de junho de 2014

El Professor

Em tempos de Copa do Mundo, lembrei de uma história, que compartilho com vocês, meus queridos amigos, e que começou mais ou menos assim:
Era fevereiro de 1986 e eu, me achando a última bolachinha recheada do pacote, comecei uma pós graduação que duraria 1 ano, e  cujas aulas começariam em março.
De fato, no início daquela semana memorável lá estava eu,  novamente,  nos bancos escolares, para fúria do Dr. Edgard, que me queria em Itaqui e não no Portinho, só que não arredei pé e recomecei os estudos, o curso era uma maravilha em termos de ensino.
Mas, maravilha,  maravilha mesmo, era o Professor de Direito Penal!
O cara entrou na sala de aula e arrasou Bangu, um homem alto, loiro,de ojos azules e cabelo crespo, vozeirão, pois é, e a matuta do interior aqui ficou de queixo caído, até hoje não sei muito bem quais eram os tópicos da matéria, lembro deles vagamente, pois meu caderno ficou com quase todas as páginas em branco,  não queria saber sobre o cálculo da pena,  interessava era o cálculo mental que eu fazia, aceleradamente, para fisgar o Professor, um figurão da Capital solterito da silva.
Partidasso, partidão.
Fui à luta, meu povo.
Tirei todos os modelitos do armário e a cada aula renovava o visual, grudei o olho no camarada com aquela tenacidade que só os que tem sangue argentino misturado com sangue italiano soem ter.
Um escândalo! Um Deus nos acuda!
Confesso, não sem vaidade, que também sacudi as estruturas do mestre o qual, volta e meia, perdia-se nas alegações e tampouco sabia se o conteúdo da aula era sobre atenuantes, agravantes ou excludentes ou sei lá o quê, fato é que ele passava a impressão de estar levemente aéreo.
Começamos a namorar,  e poderia escrever páginas e mais páginas, pois não tenho como resumir uma história de amor que nunca foi banal, mas vou tentar: éramos só alegria.
Entretanto, como nada é perfeito, no meio do caminho tinha uma pedra, ou melhor, uma Copa do Mundo, e, pior ainda, uma Seleção Argentina.
Nosso cara era descendente de alemães, e nunca jamais torceria para a Argentina, fazia caras e bocas quando a azul y blanca entrava em campo, ameaçava desligar a TV.
Imagínate!
E foi ali que a coisa começou a desandar.
Ele, por seu lado, fanático pela Alemanha.
Eu, pelo meu, doente pela Argentina, fato que ele não conseguia entender, ou se fazia que não entendia - essa é a assertiva correta.
Final de jogo, Alemanha e Argentina.
Que erro crasso cometi, caindo na esparrela de assistir o jogo ao lado dele!
Mas que baita atestado de burrice!
Parecíamos dois pit bull,  rosnando um para o outro.
Então, Dieguito Maradona, el pibe de oro,  marcou aquele golaço que sacramentou a vitória da Argentina sobre a Alemanha por 3x2.
Dei um salto do sofá, gritando enlouquecidamente, agitando minha bandeira e beijando a camiseta da Argentina, gritava tanto que não notei o silêncio a minha volta, até que vi: meu amigo tinha desligado a TV, tinha feito sei lá o que com os fios, e nunquinhas mais eu conseguiria ligá-la novamente.
Da euforia passei ao choro, do choro à fúria e da fúria ao recalque, pois não pude assistir, ao vivo e a cores, a premiação da Argentina, aquele momento único e sublime.
Nem preciso dizer a vocês que o namoro terminou ali.
Perdi o encanto por ele e nem que me jurasse a pie juntillas todo o amor do mundo não ia adiantar, como não adiantou.
Imagínate onde ele foi mexer: com meu sangue argentino! Mas aí sim, perdeu a batalha e perdeu a guerra.
Ainda bem que passei em Direito Penal.
Ao menos isso...









segunda-feira, 9 de junho de 2014

Salve, Argentina!

A colunista Martha Medeiros escreveu, em ZH de ontem(8/6) que, cada vez que escuta um brasileiro dizendo que vai torcer pela Argentina ou por qualquer outra seleção que não a nossa, não consegue evitar o muxoxo.
Que pena, Martha! Cuidado para não entortar a boca de vez, amiga!
Torço para a seleção da Argentina, tenho camiseta, bandeira, canto o hino e sou fanática pela azul y blanca, adoro os hermanos.
Bem se vê que a nobre colunista não mora na Fronteira, talvez nem desconfie de quantos casamentos aconteceram e acontecem com as bênçãos do Rio Uruguai, da ligação entre brasileiros e argentinos, afetos tecidos e entrelaçados  que, sem dúvida, nos deixam com um duplo coração.
Eu, como neta,  filha e sobrinha de argentinos não tenho como não carregar la pátria en el alma, criada que fui en las tierras de allá, que considero tão minhas quanto as do Brasil.
Só quem traz no sangue a dupla nacionalidade consegue entender como funcionam esses dois amores.
Cada vez que a Argentina entra em campo eu, sentadita no sofá com minha bandeira ao lado e de camiseta posta preparo-me, solenemente, para entoar o hino argentino, por sinal, belíssimo, e não consigo terminar a última estrofe sem chorar.
Lembro de minha Mãe maravilha, é claro.
Lembro de quando ela dizia, o peito estufado, " mirá, nena, me dijeran que tengo que me naturalizar brasileña, imagínate! Eso, jamás, mi país es Argentina, eso seria traicionar a la pátria!
E bufava de braba!
Esse amor todo pela Argentina, por seu povo, por tudo que é fabricado na outra margem do rio, ela me passou antes mesmo de eu ter nascido, e carrego-o com um orgulho bárbaro.
Torço para o Brasil, é óbvio.
Mas torço, igualmente, para a Argentina.
Que venha a Copa, e que vença o melhor.
Se for o Brasil, espetáculo!
Se for a Argentina, não nego, sentir-me-ei nos píncaros da glória!
Al gran pueblo argentino, salud!




O Brasil é Nosso!

Lembro bem que meu Pai, quando andava meio indignado com algum ato ou fato do governo, gritava:
 "O Brasil é nosso! E eu tenho os meusssss direitos!"
Esta última exclamação, então, denotava uma fúria incontida e o sentimento de injustiça que entendia ser contra ele, que trabalhava muito e tinha uma lista incomensurável de deveres, enquanto que outros pareciam ter somente direitos.
Mudou o quê, de lá para cá?
Esqueci que nunca antes na história deste país...será que havia país, antes?
Continuo vendo obras superfaturadas, corrupção, uma lista incomensurável de deveres e um montão de direitos.
Por isso, como meu pai dizia, eu também passei a dizer: o Brasil é nosso! Olhem quantas coisas temos, que maravilha, Carmen Sevilha: vale gás, minha casa minha vida, minha casa melhor, o pré sal, e tantos, mas tantos programas que nem consigo lembrar, são a perder de vista.
Assim como os bilhões.
Vocês notaram, meus amigos, que antes, a gente falava milhões e chegava a dar um suspiro.
Agora, só se fala em bilhões.
E a lista não para de crescer, são obras e mais obras.
Tem lei pra tudo, tem decreto, portaria, medida provisória, agora tem até a lei da palmada.
Graças a Deus que minhas filhas já cresceram!
Onde iremos com tudo isso?
Seria o caso de perguntar, quo vadis?
Pois enquanto os bilhões brotam das árvores  e rolam como se fossem água, o povo morre nos hospitais, tem gente passando fome, e a educação, te devo e truco.
Povo que não come, não pensa; se não pensa, não reclama; se não reclama, fica tudo como está só pra ver como é que fica.
Tanto melhor, não acham?
Afinal, o Brasil é nosso!







Inspiração

Basta um único dia sem postar alguma coisa,  que meu fã clube de meia dúzia de gatos pingados reclama: não postou nada ontem? e hoje, o que vai ser?
Muito obrigada, queridos amigos, fico extremamente alegre, feliz com tantas demonstrações de apreço pelas mal traçadas linhas que escrevo.
Mas, esclareço: não é assim que funciona, ao menos para mim.
Nem sempre estamos com a inspiração à flor da pele e, quando isso não ocorre, melhor mesmo é recolher os flaps e permanecer quieta, pois um escrito sem emoção não leva nada a ninguém, nem mesmo o escritor sabe muito bem por onde começar ou quando poderá colocar o ponto final na história.
É assim que penso e que sinto, desculpa se te magoo, mas sem emoção, não rola.
Não rola nada: nem amizade( branca, colorida), amor, sexo, dança, sem emoção as coisas não fluem como deveriam, e com a escrita não é diferente.
Notamos claramente quando algo vem escrito com aquela inspiração que brota do fundo do coração e não admite interrupções e nem pode ser postergada, sob pena de se ver perdida, e quando alguém escreve por escrever.
Como se fosse uma encomenda de empadinhas: quantas vai querer? qual o recheio, frango ou carne?
Talvez por ser uma leitora voraz, às vezes constato que algum escritor famoso escreveu aquele livro completamente perdido, enredado pela  falta de enredo,  parece que arriscando e inventando colocações um tanto quanto sem sentido,  até consigo sentir a ansiedade da criatura em preencher as páginas em branco, e a coisa não flui, não vem, estanca.
Empaca.
A inspiração é  caprichosa e autoritária. Tem que ser quando ela quer, e não quando queremos.
É ela que leva nossas mãos ao teclado, ela bate à porta de nossa mente nos momentos mais inusitados, no meio da noite, em plena rua, na fila do banco, é assim que ela se mostra, uma avalanche de pensamentos e ideias, impondo plenamente a sua vontade, e basta 1 minuto, um gesto, um ruído para que ela vá embora, saia de fininho e volte somente quando lhe der vontade.
Sinto a inspiração como se fosse um vento. Um vento morno, agradável, indizível sensação de plenitude.
Aliás, como refere Fernando Pessoa:
Às vezes ouço passar o vento;
e só de ouvir o vento passar, vale a pena ter nascido.
Uma excelente semana a todos!


















sábado, 7 de junho de 2014

Os Ruídos da Cidade

O sábado estava lindo, e a temperatura cálida, convidava a uma caminhada.
Saí de casa para  ficar uma hora do meu dia sozinha comigo mesma e com minhas circunstâncias, mas nem tinha chegado à esquina do parque quando ouvi os primeiros acordes de um conjunto que se preparava para uma jornada musical que começaria às 14 horas - e recém eram 11 horas.
A movimentação de carros e pessoas era grande, além do som, altíssimo, que vinha do palco montado do outro lado da rua.
Ali não teria como caminhar, pensei, por isso segui  rua afora e, confesso a vocês, continuei por que sou insistente.
Queria caminhar, caminharia.
Mas que deu vontade de desistir, isso deu.
As tradicionais músicas de joãozinho e mariazinha, bentinho e manuelzinho, tico e teco, purgante de óleo e chatonildo, burraldo e chato de galocha estão em todos os lugares.
Que coisa! Será que sou a única que acho essa prática de enfiar música ouvido abaixo uma aberração?
Serpentando por entre pessoas carregadas de sacolas de supermercado e de lojas, motos andando bem acima do limite de velocidade permitido e com aquele insuportável som vrrrrrrruuuuummm, não sei qual é a graça disso, mas tudo bem, vamos indo, e a barulheira continuou, carros com propaganda de eventos, mais motos, carros estacionados com o som ligado a todo volume, ou passando com um som tão alto que fazia tremer as lajotas da calçada.
Continuei, não sem indagar a mim mesma: estará por eclodir alguma guerra e não fui avisada?
Andei até chegar às margens do Rio Uruguai.
Que alívio!
Quanta paz, quanto silêncio! Na Praça do Porto não tinha quase ninguém, apenas  alguns mateadores solitários observavam o vai e vem das águas, dois cachorros rolavam na grama, e o canto longínquo de um galo era a única música que tocava.
Que espetáculo!
Majestoso, é o Rio Uruguai! Imponente, dita seu curso e não faz nenhum alarde.
Na mesma hora, lembrei de um amigo querido que mora na praia e morri de inveja - branca - dele, sortudo que escuta apenas o murmúrio do mar.
Não pude deixar de pensar no quão barulhentas se tornaram as cidades,  e de como as pessoas tem pressa em andar, em chegar, em escutar um som a todo volume, em gritar.
Pensei muito durante minha caminhada, da qual cheguei com uma dor de cabeça infernal, daquelas que só se cura com muito silêncio.
Silêncio?
Não tem.
Esse artigo está em extinção!







quinta-feira, 5 de junho de 2014

Amor de Primo

Quem nunca curtiu uma paixão por um primo, ou prima, que atire a primeira pedra.
Sei...
É.
Eu tinha uns 17 anos e minha Mãe maravilha, que adorava uma junção de parentes, enquanto que meu pai detestava, alugou uma casa em Capão da Canoa para todo o mês de janeiro. Éramos  em torno de 15 pessoas, mais ou menos, inclusive o primo, que eu nunca tinha visto nem mais gordo nem mais magro, pois era fruto do casamento anterior de meu tio e, justo naquele veraneio, resolveu dar o ar de sua graça.
E que graça, põe graça nisso!
O cara, com uns 34, 35 anos era moreno, alto, bonito, sensual e extremamente alegre, bem humorado, tinha um sorriso lindo.
Só com este último quesito já levaria todas as fichas mas, não fosse suficiente a coleção de atributos, era argentino.
Argentinoooo!
Mas que show era ver aquela melena caindo sobre a testa, o ar meio debochado e poder ouvir o muchacho hablando en español, por supuesto.
Eu vi aquele parente chegar e fiquei embasbacada com tanto charme, e ele também ficou de queixo caído por la prima, sim senhor.
Ou, como ele dizia, mi primita, que divina que sos!
Jesus, Maria e José, acudam-me!
Nós dois sabíamos, claro, que nada poderia ser feito em relação àquele encantamento mútuo, só que não tinha jeito, aonde eu ia , ele ia, onde eu estava, ele estava.
Que inferno, por que todo aquele material tinha que pertencer justamente a um primo?
A família se reunia para almoçar, ir até o mar, jogar cartas, e nós dois ali, tipo  mosca em volta do pote de mel, não sei quem seria a mosca ou quem seria o mel, fato é que parecia que tínhamos uma espécie de imã.
Minha tia Maria Luisa se flagrou da coisa toda, me puxou a um canto e disse, " ni se te ocurra hacer nada, que le pasa a ustedes dos?"
Bom, como é que eu poderia saber o que se passava comigo? A paixão não tem explicação lógica, fim de linha.
Foi um mês de janeiro fantástico, todos os dias foram de sol, de praia e de muita alegria e diversão, mas a melhor lembrança daquelas férias foi o amor enlouquecido que nutri pelo primo e, que tenho certeza, fui também correspondida.
Jamais falamos uma palavra sobre o assunto e nem precisava, porque através dos olhares dissemos tudo.
Os olhos falam, e como!
No último dia, nos abraçamos longamente, um abraço cheio de despedidas e saudade daquilo que não vivemos e que nunca iríamos viver.
Nunca mais tornei a vê-lo, e nem fiz questão.
Não dava, não daria,  não deu.
Corta.
Fim.





quarta-feira, 4 de junho de 2014

Laranjas da Estância

Meu avô paterno, Atílio Mondadori, tinha uma estância que ficava a uns 15 km da cidade, e para lá nos dirigíamos, invariavelmente aos sábados e aos domingos, meus pais e eu.
Digo estância, embora atualmente  as pessoas se refiram às propriedades rurais como fazenda, pois era assim que chamávamos aquele lugar mágico, com suas árvores imensas que sombreavam as casas, a horta, a parreira, a mangueira, o caminho de pedregulhos, bem lisinho, o açude e a lagoa.
Lá existiam duas casas, a de baixo, que era a sede, e a de cima, que ficava em um local mais alto, distando mais ou menos duas quadras uma da outra, ambas igualmente lindas, a de cima ainda mais bela, com um imenso moinho, girando lentamente ao sabor do vento.
E as laranjeiras.
As laranjeiras em flor, dando frutos, podadas, no rigor do verão, as laranjeiras, plantadas pelas mãos de meu Avô e seus empregados, cuidadas por ele, que a tudo via e por tudo zelava, eram um cenário de beleza e encantamento permanente para mim.
Muitas, incontáveis vezes, caminhei com meu Pai sob a sombra de seus galhos que, no inverno, carregavam-se de laranjas tão perfeitas quanto doces, uma calda, um manjar.
Saímos,  ele e eu, naquelas tardes frias, ele, com seu pala marrom, eu,  com um casaco vermelho que minha Mãe tinha mandado tecer no Alvear, de faquinha em punho, para colher as laranjas e comê-las ali mesmo, lambuzando-nos com aquele suco delicioso e nada mais precisávamos dizer e nem falar, para quê?
Tínhamos tudo!
Tínhamos um ao outro, a família enorme e, como se não bastasse, a ventura de ter aquela terra maravilhosa com suas laranjas e todos os demais frutos e legumes que ela produzia, sem contar o leite morninho tirado na hora, saboreado ao pé do fogo, no galpão.
Que tempos!
Toda a semana, em nossa casa da cidade chegavam os produtos da estância: ovos, leite, pão caseiro, queijo, lenha para a lareira e, claro, as laranjas.
Meu Pai gritava, louco de faceiro, Liasinha, ajuda a abrir o portão, vamos descarregar as laranjas da estância! E abriam-se as bolsas, de onde rolavam as frutas encantadas!
Meu Avô Atílio morreu, e tudo mudou.
Começaram a rarear as entregas de leite, de laranjas, as idas ao campo, a lenha não vinha mais e meu Pai, amargurado, sorvendo seu mate junto ao fogão à lenha de nossa casa,  não raro, chorava.
Deram-lhe o pior pedaço de terra da estância, quando da partilha: sem casa, sem mangueira, sem açude, sem lagoa, sem sede.
Sem nada.
Terra nua.
Terra pelada.
Sim.
Trinta anos depois, a justiça divina botou o dedo na moleira dos que fizeram meu pai chorar: o banco hipotecou tudo, mas tudinho o que era de meus tios.
A única terra que sobrou, ilesa, foi a do meu Pai, que não tinha cola e nem devia um fiapo a ninguém.
Lembrei de tudo isso quando avistei, hoje, uma laranjeira carregadinha de frutos.
Pensei no legado de amor e companheirismo que recebi de meus pais, do quanto aprendi com eles,  de como superaram tantas coisas, de como eram doces.
Tão doces quanto as laranjas da estância!




terça-feira, 3 de junho de 2014

A Bota Marrom

Andava eu lépida e faceira pelo Portinho e, como é meu costume, quando posso e dá tempo, marco um horário no salão a fim de retocar a beleza.
Não liguem, amigos queridos, é como eu digo, são os efeitos da alegria, graças a Deus.
Para lá me dirigi, feliz que nem pinto no lixo, pois como até a torcida do Flamengo sabe, sou doida por uma tarde num salão, ainda mais quando me conhecem.
Ia fazer de tudo um pouco, rematando com a pedicure, e assim foi.
Tudo pronto, lindo e achado conforme, e eu já querendo sair, porque geminiano é assim mesmo, antes, tá louco pra ir, depois que chega e se passa algum tempo, tá muito a fim de ir embora.
Vamos calçar as botas? perguntou minha amiga pedicure.
A minha bota marrom é um daqueles casos clássicos de compra apressada, ou seja, um dia a gente amanhece querendo uma bota marrom, e sai, procura, procura e não acha, encontra uma que não é exatamente o que você deseja, mas, não tem tu vai tu mesmo, enfim, a bota não tem fecho e não me perguntem como é que ela entra, é necessário um certo esforço que ela vai.
Certamente,  em algum determinando momento o fruto de uma compra apurada não vai funcionar, e a dona bota resolveu que seria naquele dia, num salão de beleza da capital completamente lotado, num sábado à tarde.
O pé esquerdo entrou normalmente.
E o direito emperrou.
Trancou.
O calcanhar não passava, de jeito nenhum.
Risinho amarelo e nervoso, que estranho, porque será que não tá entrando, e a pedicure, tenta outra vez, uma, duas,  três, quem sabe sem a meia, tira a meia, e nada.
A estas alturas, metade do salão tinha parado para olhar a fuzarca da bota que não entrava no pé direito e eu, no auge de minha menopausa que já está durando uns 100 anos,  comecei a suar.
Suava, e tentava, e nada.
O desespero começou a bater, como eu ia sair dali com um pé calçado e outro descalço? Alguma religião nova?
Mas que mico, meu Deus do céu.
A pedicure e mais uma outra falaram, talco, bota talco.
Talco! É o fim da picada!
Foi a salvação da lavoura, aliás, da situação tragicômica.
A bota entrou, finalmente, e dali saí com cara de tacho, com uma vergonha e num vermelhão e suando, mas que inferno aquela bota, odeio esta bota, nunca mais uso esta porcaria, preciso de um café bem forte, talvez sinta mais calor ainda mas azar do guarda, preciso de algo que me deixe no prumo novamente.
Rumei para um café e pedi um expresso, que tomei de um gole só, não sem pensar que podia ter ficado sem essa; enquanto isso, o pé direito,  bem campante, sem meia, soltito dentro da bota, parecia debochar de mim.
Deixei a bota no Portinho, botei pra descansar...estamos de relações cortadas, isso que ela me aprontou não se faz nem pra cachorro!
Tão cedo ela não me pega!





segunda-feira, 2 de junho de 2014

Andanças

Cada vez que estou de mala e cuia prontas para mais uma viagem, seja para que lado for, ponho-me a pensar que poderia, naquela hora, estar comodamente sentada no meu sofá em frente a TV, ou observando o foguinho crepitando na lareira e não estar ali, paradita no más, esperando o ônibus abrir, o motorista guardar a mala, subir e ficar espiando pela janela, torcendo para ir sozinha esparramada na poltrona, o que é raro, mas não impossível.
Foi o que aconteceu nesta minha volta depois de um final de semana maravilhoso que passei com minhas filhas e meu genro Pedro, baita parceria, a gente riu tanto que chegou a doer a barriga e, ao final, nem sabíamos ao certo qual era mesmo o motivo, a razão social de tanta graça.
Um presente de aniversário e tanto, poder estar ao lado de quem a gente ama, um luxo!
Entrei no ônibus e quando ele saiu, estava sozinha, sem ninguém do meu lado.
Um espetáculo, pensei, como sou sortuda, agora vou dormir como uma bem aventurada...ah, é?
Não deu.
Não deu pra dormir, acho que lá entre Santa Maria e São Borja peguei no sono por puro cansaço.
Apesar de esparramada, os roncos dos vizinhos de poltrona não me deixaram dormir, e, juro a vocês, teve um momento em que me deu uma vontade de levantar e sentar um cascudo no careca que vinha a minha frente, talvez um aperto na orelha - que dói muito, é chato. Claro que não fiz nada, embora, mentalmente, estivesse xingando até a quarta geração dos roncadores, me mantive impávida e com os olhos bem abertos, chegou num ponto xis da viagem que até rezei pra Santa Rita de Cássia, implorando, Santinha, por favor, faz com que eles parem, pelo amor de Deus.
Certamente, Ela deve ter rido da minha cara, pois tem coisas muito mais importantes para atender que o pedido de uma passageira desesperada por um pouquinho de silêncio, e a cacofonia seguiu, tinha para todos os gostos, ronco seco, ronco molhado, um arfava, outro fazia aahahhh, enfim, acho que ronco é pior que mosquito no ouvido.
Difícil.
Nada disso, entretanto, tira minha vontade de sair por aí, e foi nisso que pensei quando vi, antes de embarcar, uma mãe e seu bebê, subindo em outro ônibus, a pobre mãe caindo e levantando com a sacola, a mamadeira,  uma mantinha, o bico, e a criança que berrava, berrava muito.
Lembrei do tempo em que ia para a praia com a Rita, de 2 anos, e a Marina, de meses, com o mesmo carregamento, tudo para ver o mar no sábado de manhã e voltar no domingo a noite, ou quando enfrentava as 9 horas de Porto Alegre até o Itaqui com a dupla dinâmica.
É quem nos espera do outro lado da linha que faz a gente sair de casa, deixar a zona de conforto e enfrentar a estrada, o dia ou a noite todinha, não faz mal, porque o sorriso de quem está nos esperando compensa tudo, o abraço que a gente recebe e dá quando chega vale qualquer sacrifício, a ponto de nos fazer esquecer o cansaço e ir novamente.
Os pés ainda nem desincharam e já estou de olho no calendário e no próximo feriadão.
Roncos?
Nem presto atenção, não me importo...
Nada como chegar de viagem e ficar planejando outra.
Excelente semana a todos!