segunda-feira, 27 de julho de 2015

De Mão No Bolso

Eu gosto de observar pessoas e lugares.
Quem assistiu ao filme Para Sempre Alice, agora também pelo Netflix, não ficou imune àquela história, baseada em fatos reais.
Alice, uma Professora universitária de renome depara-se, aos 50 anos, com um diagnóstico de Alzheimer e o que se vê, da metade do filme em diante, é uma história triste, deveras mas, acima de tudo, de superação e dos novos arranjos familiares que, necessariamente, tiveram de ser feitos.
Triste e muito real, pode acontecer com qualquer um de nós.
Saí pensativa do cinema, pois o filme nos leva à reflexão e não há como não imaginar-se em um quadro como o dela.
Cinquenta anos e eu, 54.
Nada me assusta mais que perder a compostura.
A lucidez, esse seria o termo correto.
Depender da bondade e da paciência dos demais para realizar as mais triviais tarefas deve ser algo muito aterrador para alguém acostumado a caminhar com as próprias pernas.
Por isso eu, que observo muito o que me rodeia, fico deveras impressionada com algumas pessoas que conheço e, depois que se aposentam, parece que também deixaram de lado a vida.
Explico-me.
Eu vou para o trabalho todos os dias e, num determinado ponto do caminho, passo por um senhor, recostado  no muro de sua casa, parado, mãos nos bolsos das calças, observando o vai e vem das pessoas e dos carros.
Quando chego no trabalho, deparo-me com um outro cidadão, recostado no muro da Prefeitura, parado, com as mãos nos bolsos das calças, observando o vai e vem das pessoas e dos carros.
Eu sinto uma vontade incomensurável de gritar, tiraaaaa a mãoooo do bolsssooo, e vai arrumar um pátio pra capinar!!!
Meu Deus do céu., como é possível que um ser consiga ficar parado, olhando, numa posição de completa inutilidade, a vida passar?
Os modelos que carregamos nos fazem criar imagens do que é certo ou errado e isso, definitivamente, não está correto.
Eu tenho um modelo familiar de avós, pais, tios e irmãos altamente produtivos.
Portanto, causa-me espécie quando vejo um homem paradito, olhando...
Sim, isso me dá vontade de gritar: tiraaaaa...
Por sorte, o mecanismo de controle que me foi ensinado ainda funciona e fico a pensar, cada vez que observo ditas cenas - todos os dias, por sinal, que nada, absolutamente nada tenho a ver com a atitude de contemplação de tais pessoas.
Nadica de nada.
Porém, rogo a Deus (além de não perder a compostura):
Ó Senhor, não deixes que me transforme em uma senhora aposentada, parada, recostada  numa parede, olhando a vida passar. Livrai-me do mal da inutilidade.
Amém!  





Gavetinhas

Eis-me aqui, depois de horas.
O meu fã clube de meia dúzia de gatos pingados, não raro, vêm se insurgindo com a escassez de publicações o que, por um lado, me honra e envaidece mas, por outro, preocupa-me.
Ocorre que tive a ideia de criar um blog e fiquei meses a fio ruminando qual seria o título, os temas que abrangeria, a forma da escrita, enfim.
Conclusão: a forma de escrever é a minha e não há cursinho ou dica que me faça mudar o jeito e o modo de fazê-lo.
Não sei se isso é bom ou ruim, fato é que não há como dissociar o meu eu e a forma como encaro a vida, o trabalho e as relações pessoais daquilo que escrevo.
A raiz disso, aliás,  lembrei-me que, aos  nove, dez  anos, costumava escrever redações e hoje, por incrível que pareça, quando recordo dos conteúdos, vejo que nada mudou.
Por tais razões, este meu jeito não irá sofrer alterações uma vez que, para mim, escrever é um ato sublime, recuso-me  a fazê-lo sem vontade ou apenas para, com o perdão da expressão, encher linguiça, que pese as reclamações do meu fã clube às quais, comovida, agradeço.
É que a escrita é caprichosa, fato que já comentei em postagem anterior, ela não é um botão automático que ligado, dá início a uma produção em série.
Ao menos para mim, não é assim que funciona.
Por outro lado, preciso registrar que,  ocupada com tantos assuntos, as postagens começaram a empilhar-se num escaninho da mente há dias, e ali ficaram, me cutucando...e aí, não vai escrever hoje? como assim? ué, sais, abandonou o barco?
Algo como se meu cérebro fosse composto por gavetinhas que se abrem e se fecham e, ali, as ideias vão se misturando e se sobrepondo, caso não decida colocá-las no papel.
Um inferno na torre!
Confesso que, em determinados momentos, aí sim, eu gostaria que minha mente tivesse um botãozinho de desligado.
Não tem.
Para evitar que as gavetinhas fiquem por demais bagunçadas,  tomei uma decisão. a fim de por ordem na coisa, ou melhor, na mente,  vamos esvaziar as gavetinhas!
E o resultado dessa movimentação interna, espero, para o bem dos queridos leitores, e para o meu próprio, que nos seja propício.

* Uma feliz e abençoada semana a todos!!!


quinta-feira, 2 de julho de 2015

A Vaga Comprada

Tempos atrás me contaram uma história.
Certa pessoa não conseguia, de jeito nenhum, entrar na Universidade e a abastada família, cansada de ver, ano após ano, seu rebento tomar ferro no vestibular, decidiu dar uma tenteada e foi lá, levar um papo reto com o reitor.
Lá chegando, disse-me essa pessoa, tomou um chá de banco daqueles, mas não se intimidou e permaneceu na sala de espera da reitoria por horas a fio, até que foi atendida.
O resultado de tal conversa não me foi contado, mas o fato é que, um par de meses depois, o jovem que queria entrar na Universidade mas não conseguia passar no vestibular estava lá, lampeiro da silva.
Eu não sei se isto é mentira ou é verdade.
O que me causou espécie é que, na época,  seu nome não constava na lista dos aprovados, nem na lista do remanejo.
Entretanto, atenho-me a comentar o fato de um pai ou uma mãe se prestarem para ir até uma reitoria para tentarem comprar uma vaga para o(a) filho(a) burro.
É preciso ser, além de cara de pau, extremamente mau caráter.
Esta historieta que me foi contada e, repriso, desconheço se é verdadeira ou falsa, causou-me verdadeira repugnância pois, ao ouvi-la, não pude deixar de lembrar do tanto que ralei para passar no vestibular.
Concluí o ensino médio aqui, no Itaqui e, com 16 aninhos, cheguei de mala e cuia em Porto Alegre.
Não sabia nada de coisa alguma, como aliás, já postei  anteriormente, mas isso não foi empecilho para que eu buscasse, a cada dia, aprender.
Um dia, outro dia.
Semanas.
Meses.
Um ano inteiro!
Enquanto os demais estavam na praia, eu estava ali, estudando, de manhã, de tarde, de noite.
Eu queria passar no vestibular!
E passei.
Não nego que uma das maiores emoções que senti na vida foi quando escutei meu nome sendo pronunciado pelo repórter da Rádio Guaíba.
Aquela conquista era minha, e somente minha.
Todos me ajudaram a chegar lá, mas se eu não tivesse me esforçado muito, não teria tido aquela alegria.
Bueno, então, eu posso dizer, de boca cheia, que entrei na Universidade pela porta da frente, e de lá saí, após os cinco anos de curso regular, igualmente pela porta da frente, com meu precioso Diploma em mãos.
Não houve necessidade de o Dr. Edgard, meu amado Pai, ir até a reitoria pedir penico e vender meia dúzia de cabeças de gado puro de pedigree para comprar uma vaga para mim.
Em tudo isso eu pensava, escutando aquele papo brabo de compra de vaga.
No começo, incrédula.
Depois, com nojo.
Agora, passados mais de quinze anos desta história, o resultado: a pessoa para quem, supostamente, foi comprada a vaga na Universidade, tornou-se um profissional movido apenas pela ganância e pelo dinheiro, sem ternura e compaixão.
Não estranho: se você tem um pai e uma mãe que vão até uma universidade tentar comprar uma vaga pra você, o que eles estão dizendo? que o dinheiro compra tudo.
Mas será que compra mesmo?
A suprema ventura de entrar e sair da faculdade pela porta da frente, sem nunca ter precisado valer-se de qualquer ardil para conseguir o ingresso, ah, isso, o vil metal não compra!










Pensando No Meu Pai

Quando estou alegre, lembro-me do meu Pai.
Quando estou triste, idem.
E quando preciso, desesperadamente,  de um ombro amigo e de um conselho daqueles que recebemos só de quem nos ama muito, sem pedir contrapartida,  penso nele.
Aliás, dias há em que consigo senti-lo tão perto que poderia, quiçá, tocá-lo, chego a ouvir sua risada alta, alegre, que não deixava dúvidas, sim, ele estava de bem com a vida.
Hoje lembrei-me dele logo que acordei, saí para o pátio gelado, cedinho da manhã, para observar o dia e o céu lindo do meu Itaqui.
Parêntese:
Eu ando, viro, vou e volto, e sempre vejo-me a pensar no quão ligada estou a esta terra.
Adoro viajar, é verdade, é um privilégio poder visitar lugares, conhecer novas paisagens, rever amigos, fazer programas diferentes.
Mal chego, ponho-me a matutar sobre o próximo destino.
Só tem uma coisa: lá pelas folhas tantas, eu quero voltar.
Quero voltar para o Itaqui.
Preciso rever a Praça com suas árvores majestosas, olhar para o prédio da Prefeitura, passar pela Igreja Matriz de São Patrício, encontrar meus amigos e afetos, conhecidos, ir até a padaria, ao Salão de Beleza que frequento há mais de 12 anos, eu preciso.
Cada vez que volto do Porto Alegre, o povo de lá me questiona: por que não vem de muda para cá?
E eu, realmente, sinto-me tentada, não vou mentir.
Entretanto, há algo que não me deixa partir: são minhas raízes.
Eu nasci e me criei no Itaqui, aqui criei minhas filhas,  a maior parte de minha história de vida está aqui.
Tudo isso veio à baila por uma razão mui simples: preciso tomar decisões e não posso errar.
Não devo errar, isso é um luxo permitido a quem tem 20 anos, não a quem está com 54.
Será?
Fecha parêntese.
Voltemos ao início: quando estou alegre, lembro-me do meu Pai.
Quando estou triste, idem.
Ao ter que decidir sobre determinada questão, pensei nele ainda mais, em sua figura ímpar, no seu abraço.
Que falta tremenda me faz o seu abraço!
Vejam vocês, queridos amigos, como são as coisas.
Eu saí para o trabalho matutando, falando mentalmente com ele, contando a ele de algumas amarguras e aborrecimentos, e dessa forma fui indo.
Quando desci do carro, quase de imediato, um amigo me avistou e veio ao meu encontro, de braços abertos, e me deu o popular abraço de urso, tão apertado que quase sufoquei, e ali ficamos conversando, na calçada da prefeitura, por alguns minutos.
Não pude deixar de pensar que aquele abraço do meu amigo era muito parecido com o do meu Pai.
Quem sabe um recado...
E, como já postei aqui outras vezes, o poder do abraço e sua força são como um remédio para a alma e para o coração.
E, de acabrunhada que vinha, passei a sentir uma grande alegria.
Um par de horas depois, eis que surge a resposta para minhas dúvidas e questionamentos, tão fácil e simples que até me pareceu um verdadeiro milagre.
E o notável é que, a todo instante, sentia a presença do meu Pai do meu lado, a me amparar e confortar, como nos velhos tempos.
Há certas coisas que não conseguimos explicar.
Apenas sentimos.
O que posso dizer, então, é que há uma energia, emanada do amor, que permanece e, de alguma forma, se comunica, não importa o tempo ou o lugar.
E hoje pela manhã, recebi uma mensagem muito clara dele: primeiro, através do abraço do meu amigo e, depois, pela notícia, há meses esperada.
Também pensei em sua tenacidade e perseverança, nos tempos difíceis de sua vida, na força com a qual enfrentava ventos e tempestades.
Ele era um lutador, portador de uma fé inquebrantável.
Aprendi tanto com meu Pai.
Continuo aprendendo.
Grandes lições trouxe-me o dia de hoje.
Encerro, alegre e, como não poderia deixar de ser...pensando no meu Pai.