quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

Perdimentos e Reencontros

Durante longo tempo, cavalguei num Tordilho todo enfeitado.
Fiz questão de adornar meu cavalo negro com as plumas da arrogância e da insensatez e saí, mundo afora, sem olhar para os lados e, muito menos, para trás.
Não pensava no dia de amanhã, qual o quê!
Batia, em meu rosto, o vento morno da indiferença para com meus semelhantes e seus males.
Imaginava, em minha completa ignorância, que fazer caridade, ser "bom" e ir a Missa regularmente seria uma espécie de salvo conduto que me livraria "de todo o mal, amém".
Naquele tempo de tamanho perdimento existencial,  exibir-me com meu corcel emplumado, andando para lá e para cá, acompanhada pela cegueira do egoísmo, era o que me bastava.
Eu pensava que era boazinha e que o fato de não praticar atos ruins e cruéis seria suficiente.
Ledo engano.
Percorri anos a fio esse caminho, impulsionada pela soberba e, tão deslumbrada estava que não me dava conta que ia deixando, por onde passava, partes de mim, e me perdendo dos outros, ignorava solenemente os que encontrava ao longo desta via chamada Vida.
Quando, um belo dia, surgiu a minha frente um obstáculo que me obrigou a interromper, subitamente e sem aviso a marcha da vaidade, o Tordilho se empinou e quase me derrubou.
Ficamos parados ali, nós dois, olhando a cena que começava a se desenrolar a nossa frente.
Desci do cavalo, e rápido, pois não houve tempo para questionamentos.
Pouco a pouco, livrei-o dos seus muitos adereços, todos eles, concluía eu naqueles momentos, absolutamente inúteis: a arrogância saiu de fininho, envergonhada; a insensatez cedeu lugar às interrogações; a indiferença deu passo à solidariedade e me fez enxergar coisas dantes nunca vistas; o egoísmo, apavorado, escafedeu-se.
O Tordilho confundiu-se com o pretume da noite sem Lua, e também desapareceu.
A pé e sem enfeites me vi, diante de um caminho desconhecido e assustador.
Noite escura, breu, e a solidão e o medo.
Muito medo.
Para onde irei?
Eis que, pouco a pouco, começaram a aparecer algumas luzes.
E pessoas, muitas pessoas!
Cada uma delas segurou minhas mãos e foram me impelindo a seguir adiante, um passo e outro passo, um dia e outro dia.
De repente, não estava mais só.
A beleza da amizade, a pureza dos amores, o abraço solidário e desinteressado e sincero devolveram-me tantas coisas que eu havia perdido pelo caminho que, desse reencontro comigo mesma, resgatei um valor esquecido, mas fundamental: a humildade.
Agora, ando sobre minhas próprias pernas, de mãos estendidas para os outros, com os outros e pelos outros.
Não mais me interessam as futilidades que tanta energia me roubaram, menos ainda, tordilhos ajaezados.
Há tantas riquezas a nossa volta que, quando olhamos de cima, sequer percebemos: nossos bichos de estimação, flores, um céu lindo e um sol radiante, a chuva que cai e renova tudo, estar ao lado de quem amamos,ajudar quem não conhecemos...
Este é o primeiro capítulo de uma história de muitos reencontros.
Aguardem os próximos!










Nenhum comentário:

Postar um comentário