sábado, 6 de setembro de 2014

A Sombrinha Vermelha

Lisiane tinha uma sombrinha vermelha, pela qual nutria especial predileção. Comprara-a nas Lojas Renner num dia de sol mas, da vitrine, a sombrinha estava ali, olhando para ela, e não importavam nem a hora - imprópria, estava com os minutos contados, nem o valor -  longe do final do mês o dinheiro era curto, mas ela precisava comprar aquela sombrinha.
Aquela.
Entrou na loja, pediu para vê-la e, de perto, encantou-se ainda mais, pois a sombrinha vermelha parecia ter vida própria, tão exuberante era.
O cabo era de madeira, firme, forte. O tecido era um misto de gabardine com seda,  um tom de vermelho perfeito, nem muito claro que beirasse o laranja, nem muito escuro que parecesse vinho.
Não.
Era vermelho.
Encarnado, a cor predileta de Lisiane.
Olhou, abriu e fechou a sombrinha e ali mesmo decidiu: iria comprar aquele objeto do seu desejo.
Saiu dali radiante, empunhando sua nova aquisição como se a mesma fosse uma joia de incomensurável valor.
É que, na verdade, a sombrinha, embora linda, era o de menos.
O importante era que Lisiane havia bancado seu desejo.
E, naquele gesto simples, ela entendeu tantas coisas de sua vida...
Era infeliz, e sabia, mas não tinha coragem de mudar e chutar o pau da barraca.
Não gostava da profissão, mas lhe faltavam forças para colocar um ponto e começar algo novo.
Queria sorver da vida até a última gota, mas tinha medo de voar.
A compra da sombrinha vermelha foi uma carta de alforria para Lisiane.
Ela saiu da loja decidida a mudar e mandar para longe tudo o que atravancava seu caminho e terminava com sua alegria.
Foi lá,  e fez.
Hoje, um dia chuvoso e cinza,  lembrei dessa história que me foi contada.
Associei o tempo à sombrinha vermelha mas, sobretudo, àquilo que ela simbolizava: o poder ser, o querer, a liberdade, o fato de andar sobre as próprias pernas e ser dona de si.
O poder da escolha.
Pois, embora sejamos seres com plena capacidade de discernir o que é bom e o que é ruim, o que nos agrada e o que nos faz feliz, muitas vezes  precisamos de algum objeto que nos faça enxergar tais valores.
Algo que nos sirva de amparo em dias de chuva.
Mesmo que seja uma simples sombrinha vermelha!



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