sábado, 22 de março de 2014

22 Quilômetros

Quando eu morava no Pensionato Teresiano,onde fiquei por três anos, tínhamos uma turminha que se reunia, invariavelmente nos finais de tarde pra tomar um mate, fazer café e conversar fiado. Eram pessoas dos mais diversos pontos do estado, todo mundo ali fazia cursinho ou faculdade, e foi um período de vivências novas pra mim, e de muita, muita diversão. Riso fácil, graça em tudo, piadas sobre qualquer coisa, de nosso crivo ninguém escapava.
Eu, bacudésima do interior,  achava aquilo tudo lindo demais, aquela reunião de 7, 8 gurias que se formava todo santo dia pra falar abobrinhas e outros afins.
Sábado era o dia D: de comprar vinho de garrafão, o mais barato, claro, porque   ninguém  nunca tinha um centavo sobrando, algumas bolachinhas e marcar a " festa",  pra começar bem o fim de semana. Íamos até um super que ficava perto dali e fazíamos nossas comprinhas, que a gente trazia enroladas em algum moleton para que a freira da portaria não percebesse o que era. Combinávamos no quarto de quem seria a junção, e pra lá carregávamos o rádio de uma, a TV da outra, copos, e o tal do garrafão de vinho, claro.
Vejam vocês, queridos amigos, como o que realmente importa é o espírito da coisa, porque o que sobrava em todas nós era uma vontade louca de falar qualquer quantia de bobagens e rir, rir muito, o vinho era apenas um mero pretexto que usávamos para celebrar nossa camaradagem.
Tínhamos uma colega que era especialmente agitada, sim, ela era muito engraçada. Moradora da região da serra, estudava arquitetura e o noivo, engenharia. Ela jamais faltava a esses encontros, até porque, sem ela, a coisa ficava meio capenga, meio morna.
Ela saía com o noivo às sextas feiras e, geralmente, aos sábados, ficava no Pensionato porque precisava estudar para suas provas - não sem antes, claro, tomar um foguetaço de vinho tinto.
Tomadas as primeira canecas, já começávamos a rir bem mais alto que o permitido e a soltar a língua e a dizer o nos viesse à cabeça, e nossa amiga jogava-se no chão, ou na cama e, rindo muito, anunciava:
" Ontem, eu e o Roberto(vou chamá-lo assim) corremos 22 quilômetros! Que coisaaasa mais boaaaaa!!! E gargalhava, e ria, e dê-lhe vinho.
Eu pensava: nossa, que legal deve ser correr tudo isso, 22 quilômetros!!! e calculava, mentalmente, puxa, da Praça de Itaqui até o Quartel são 5 Km, do Porto até a Tito, mais 4, como eles correm, hem.... e a risada seguia solta, e nossa amiga alardeava aquilo noite afora.
Por vezes, no meio da semana, ela chegava afoita da rua, os olhos brilhando,  e comunicava: acabei de correr 22 quilômetros! Tô poooodreeee!!!
Até que um certo dia, acho que com um pouco de pena de minha ignorância, ela colocou a coisa  assim, direto sem escalas: guria, passei a noite de ontem todinha transando com o Robertãoooo, ENTENDEU? Correr 22 quilômetros foi uma medida que nós inventamos, é uma tabela que foi criada na....mas eu não escutava mais, sufocada pelo riso.
A partir dali, todas nós adotamos aquela expressão.
Lembrei de tudo isso porque, depois de ter ficado cinco dias circulando pelo Portinho e longe do maridão preciso, urgente, correr 22 Quilômetros!




Nenhum comentário:

Postar um comentário