domingo, 25 de maio de 2014

A História da Panelinha

Chamava-se Leonor Praxedes ou, como por todos era conhecida,  simplesmente  Doña Praxedes.
Ou La Vieja.
Doña Leonor nascera na Espanha e chegara a República Argentina lá  pelo ano de 1950,  formando família e  fortuna.
Riquíssima, embora  feia e ruim de gênio, possuía um grave defeito: era miserável até não poder mais.
Além disso, falava sozinha e adorava criticar  quem cruzasse seu caminho, por isso chamavam-na de La Vieja, fosse pelos hábitos estranhos, que incluíam desde comer de qualquer jeito, nem sequer dava-se ao trabalho de arrumar a mesa, como o de manusear os talheres de forma grotesca e o de andar sempre escabelada como se tivesse acabado de sair da cama, Donã Praxedes fazia parte do folclore local e, apesar da riqueza e da gorda conta bancária, que de nada lhe valeram para polir-se um pouco, constituía -se persona non grata, enfileirando uma quantidade razoável de maridos, empregados e ajudantes, que não toleravam permanecer com ela mais de seis meses.
La Vieja tuvo cinco hijos,  dois homens e três mulheres, todos casados e, por sua vez, com filhos.
Entretanto, Susana, a esposa do filho mais velho era a pedra no sapato de Doña Praxedes, e vice versa.
Ambas mantinham um relacionamento pro forma, só para inglês ver.
Tão diferentes quanto a água do vinho, sogra e nora não conseguiriam jamais misturar-se, como água e azeite não se misturam nunca.
Explicava-se.
Susana era fina, filha de uma tradicional família do lugar, enquanto que a sogra era tão rica quanto mal educada.
Talvez tivesse sido a Guerra...
Enfim.
Certo dia, embora tenha se perguntado um sem fim de vezes a razão daquilo, Susana recebeu em sua casa, das mãos do marido, uma panelinha.
"A mamãe mandou para você, Susana, o que sobrou do almoço. E, como a empregada não veio hoje..."
Dentro da panela, assim, misturados, estavam uma coxa de galinha, um pouco de arroz, uma salada de batatas, duas rodelas de tomate e, a um cantinho, uma gororoba que imitava sopa, mas não dava para identificar o que era.
Susana olhou, olhou, olhou...
Não deu um pio.
Imediatamente, lembrou-se de sua Mãe, falecida há muitos anos, e sentiu uma raiva do tamanho de um trem começando a explodir dentro dela.
Raiva e nojo.
A implicância de La Vieja para com ela chegara ao seu ápice, mas terminaria ali e agora.
Não disse nada, seguiu muda, rumou para o pátio, despejou todo o conteúdo no lixo e, ipso facto, começou a demolir a panelinha maldita.
Jogou-a contra o muro de pedras e, a cada batida, amassava-a de um lado.
Depois outro golpe, e outro, e outro, até não restar nada, apenas uma lata amassada, que guardou num saco de supermercado.
No dia seguinte, foi até a casa da sogra e deixou, sobre a mesa, o pacote contendo o que restara da panelinha.
Encararam-se, as duas, com olhares ferozes, e nada foi dito e nem precisava, a lata amassada dizia tudo, parecia gritar sobre a mesa.
Susana saiu da casa e da vida de Doña Praxedes para nunca mais tornar a vê-la, pensando, no caminho, na celebre frase da escritora brasileira Clarice Lispector:
" Valorize quem te ama, esses sim, merecem seu respeito. Quanto ao resto, bom...nunca ninguém precisou de restos para ser feliz."









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