terça-feira, 20 de maio de 2014

Independência, nº 1087

Corria o ano de 1981, e meu Pai, atendendo minhas súplicas, decidiu alugar um apartamento para mim, pois três anos de pensionato estava de bom tamanho e como já me considerava quase uma porto alegrense, precisava de mais espaço e de  tempo, não conseguia mais me submeter aos horários impostos pelas Irmãs, Lia La Loca andava a milhão por hora e queria sair para desbravar o Portinho e todos os seus encantos. Assim, passei o mês de dezembro e boa parte de janeiro buzinando nas orelhas do Pai, dedicada à  tarefa de convencê-lo que  alugar um apartamento seria a oitava maravilha do mundo.
 Uma verdadeira sarna galega, falava no assunto dia e noite,  até que consegui meu intento.
Visitamos vários imóveis e o último, na Av. Independência, foi amor à primeira vista. Era mobiliado, tinha tudo e, como se não bastasse, a localização era excelente.
Fiz a mudança num tórrido mês de fevereiro sob um calor de rachar,  e quem se importava com isso? Cheguei, triunfante, Pensionato adentro para pegar minhas parcas tralhas e, of course, o famigerado radinho preto.
Tudo coube num táxi, saí da Av. João Pessoa direto para a Av. Independência e nem olhei para trás, aliás, uma característica minha, meu tempo de quartinho abafado e minúsculo terminara, estava indo morar num ap. de fundamento e foi lá, realmente, que minha vida mudou para muito melhor.
Morei dois anos e meio completamente sozinha.
Eu e Deus, meus discos e livros, o amigo rádio, alguns badulaques a título de enfeite, e fim de linha.
Passei um período de  fantástico auto conhecimento, fazia meu matecito e, sentada na sala ficava observando o céu que enxergava pela janela e pensando, matutando, tecendo sonhos, feliz com minha companhia.
Digo, tranquilamente, que foi uma experiência e tanto e, graças a ela, por mais que sinta uma saudade tremenda de minhas filhas, todas morando longe de mim, jamais pediria que abrissem mão de sair de casa para viver e escrever suas próprias  histórias.
São momentos únicos, que servem de aprendizado para o resto de nossas vidas.
Hoje olho para trás e vejo que, embora fosse agitadíssima - e ainda sou, sempre preservei meu apê, ali era meu refúgio sagrado, somente alguns amigos e colegas iam lá.
Saía de casa às 7h15 min. e descia a Felipe Camarão para pegar o ônibus na Osvaldo Aranha, em 20 minutos estava na PUC e, na volta, repetia o mesmo trajeto.
De tanto comer massa miojo com salsicha e ovo cozido, criei coragem e decidi que precisa aprender a cozinhar, e como a dor ensina a gemer e quem tem boca vai a Roma, consegui algumas receitas e assim fui me aventurando no mundo da culinária, até  fazer alguns grudes razoáveis.
Jamais padeci de solidão,  não tinha tempo para a tristeza, era absolutamente livre, e a liberdade é o bem maior que o ser humano pode ter!
Não por acaso, eu passara a morar numa avenida chamada Independência!




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