quinta-feira, 28 de agosto de 2014

A Vendedora de Morangos

Cinara nascera e se criara em uma pequena propriedade rural, no interior de Itaqui.
Na terra fértil de quatro hectares onde tudo dava,  a família tirava seu sustento plantando alfaces, tomates, salsa e cebolinha, manjericão, pimentões, rúcula, couve e abobrinhas.
E havia, também,  os morangos.
Um canteiro inteirinho, uma larga faixa de terra destinada exclusivamente aos morangos.
Cinara era fascinada pelas frutinhas vermelhas e cuidava pessoalmente daquele espaço que parecia um tanto quanto mágico,  brotava a um simples olhar de sua cuidadora.
Cinara era bela, tinha olhos negros, cabelos encaracolados e uma pele clara e lisinha que nem o sol causticante dos verões itaquienses conseguira manchar.
Do alto de seus vinte anos, dos quais dez já vinham sendo dedicados ao plantio de verduras e frutas, Cinara frequentara a escola de forma precária. Conseguira concluir o segundo grau a duras penas,  mas sonhava, e sonhava grande.
Um dia estudaria muito, para entender melhor o manejo e a fórmula para que seus morangos frutificassem ainda melhor.
Uma vez na semana, ela vinha até a cidade numa pequena caminhonete carregada de produtos, para vendê-los na feira da praça central de Itaqui, onde se reunia com outros feirantes para tomar chimarrão e conversar sobre sementes, adubos, o tempo, a chuva, o frio, a geada.
Cinara cuidava tanto de seus morangos e apresentava-os tão bem, que formavam-se filas para comprá-los.
Na véspera, tinham sido cuidadosamente lavados por ela, acondicionados em caixinhas, e exalavam um perfume delicioso, de dar água na boca.
Assim corriam os dias para Cinara, a Vendedora de Morangos, como era carinhosamente chamada pelos fregueses.
O que ninguém sabia e nem sequer desconfiava era que Cinara, durante a noite, alegando cansaço e sono, ia cedo para seu quarto e lá se punha a estudar, devorando todos os livros que uma amiga professora  lhe emprestava.
Fazia os exercícios, repetia-os e lia, mais de uma vez, os conteúdos, até cair exausta pois o dia recomeçaria dali a pouco.
Com a ajuda de sua amiga professora, fez a inscrição para o Vestibular de Farmácia. A amiga, que tinha parentes em Santa Maria, encarregou-se de levá-la e custeou uma parte das despesas.
Cinara passou.
Voltou para casa radiante, para dar a notícia aos pais e comunicar que, em março, iria embora para Santa Maria para estudar e realizar seu sonho.
Correu e se virou mais que bolacha em boca de velho, economizando cada centavo das vendas que fazia, até o dia da partida.
Ficou longe de sua terra por cinco anos.
E, durante todo esse tempo, seu canteiro de morangos, inacreditavelmente secou,  não produziu um mísero fruto.
As pessoas sentiam falta da vendedora de morangos; não havia frutos como os que eram vendidos por Cinara.
Concluído o curso, ela voltou.
A primeira coisa que fez foi preparar a terra, limpando-a, retirando as ervas daninhas.
Semeou pacientemente, muda por muda.
E colheu.
Colheu tanto que não dava vencimento, tal a quantidade de frutos.
No tempo da faculdade, Cinara fizera cursos, e aprendera a preparar geleias, doces, cremes, sabonetes, ela sabia todos os processos.
Então, a Vendedora de Morangos virou microempresária de sucesso, montou uma empresa altamente rentável e comercializou um sem fim de produtos.
Ampliou a casa, comprou mais hectares e triplicou a produção.
Durante as noites estreladas de verão, sentada em uma cadeira de balanço, Cinara sentia o perfume dos morangos que se espalhava por toda a propriedade, e não deixava de pensar que nada se consegue sem muito trabalho, esforço e uma boa dose de sacrifício mas, sobretudo, pela perseverança na busca dos sonhos.
Ela perseverara.
E vencera!





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